quinta-feira, março 29, 2007

Alberto Tamer - Irã, em crise, raciona gasolina




O Estado de S. Paulo
29/3/2007

Confirmado. O Irã, que detém 10% das reservas mundiais de petróleo, já raciona gasolina. Mas não é só isso, está racionando e importando. Sim, no ano passado foram 25 mil barris por dia e neste, só não terá de importar mais porque enxugou o mercado. O abastecimento interno é precário e a frota de carros aumenta mais do que a oferta de gasolina. Isso confirma, mais uma vez, o que já demos nesta coluna,o Irã está vivendo uma crise petrolífera provocada, principalmente, pela sua insensata e imprudente política nuclear.

Quer enriquecer urânio ao nível que lhe permita produzir a bomba atômica, gerar energia elétrica, mas não alimenta motores. Mas, qual a relação entre os dois fatos?

INVESTIDORES SUMIRAM

Os investidores que vinham financiando o programa de ampliação e melhora do parque de refino, técnica e operacionalmente superado em pelo menos 30 anos, desde a tomada do poder por Khomeini, simplesmente sumiram. Mais grave, os mesmos investidores externos suspenderam ou estão retardando precavidamente as explorações das imensas reservas de gás situadas no Norte do país.Não há segurança. Ninguém sabe o que vai acontecer no país. Um gás hoje talvez tão importante para a matriz energética mundial do que o petróleo.

Os iranianos têm a segunda maior reserva do mundo enterrada em áreas desertas. Compara-se apenas com as da Rússia, já em franca exploração, atendendo grande parte da demanda européia. Os russos foram comunistas, caminham tortuosamente para um capitalismo ainda distante, mas não são fanáticos. Não têm aiatolás por lá. São realistas, fornecem até para os Estados Unidos.

É chocante porque as reservas iranianas são de fácil acesso e baixo custo de exploração.

O IRÃ ESTÁ BLEFANDO

A afirmação é ousada? Mas eles não se dizem poderosos e auto-suficientes, não precisam de ninguém, desafiam o mundo ameçando-o com sua bomba? Pois vamos aos números oficiais divulgados agora e você, leitor, verá que estou sendo até cauteloso. (1) O Irã produziu 3,8 milhões de barris de petróleo por dia em 2006, quase 5% da oferta mundial, mas exportou apenas 2,5 milhões porque o consumo interno aumentou. A produção estagnou por causa da falta de investimentos na conservação dos campos e há anos não se abre outros. (2) Entre 2005 e 2006, com relação à produção, as exportações caíram de 80% para 6%. Consomem mais, exportam menos.

São dados oficiais da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), fornecidos pelo governo iraniano. Não há aiatolá que possa negar.

Mesmo assim, não há exagero em afirmar que o Irã está quebrando? Um número, também oficial, responde. As exportações de petróleo representam 85% de toda a receita nacional! Eles só têm petróleo e petróleo.

E diante da insegurança no abastecimento e a aventura nuclear em que governo iraniano entrou agressivamente, posando como se tivesse força para chantagear o mundo. Ameaçando com uma maior redução das suas exportações, o bloqueio do Estreito de Hormuz, poucas centenas de quilômetros por onde passa mais de 60% do petróleo do Oriente Médio - inclusive o do Irã.

Com isso, jogaram o país num isolamento econômico e financeiro de tal ordem, que seus tradicionais clientes, no Leste Asiático, já estão fechando contratos com outros fornecedores, entre eles a vizinha Rússia que vem construindo, com a ajuda do capital externo, gasodutos e oleodutos.

Resumindo, o Irã, com sua política desarticulada, criou para si mesmo uma situação em que irá se afundar ainda mais. Pouco lhe resta agora a fazer Para se livrar de um isolamento provocado pela sua retórica nuclear, está caminhando para um esvaziamento diante do aumento das sanções da ONU.

A política caótica dos aiatolás - e sempre foi assim desde Khomieni - está levando o país a uma situação que poderá se tornar internamente insustentável a médio prazo, pois já se tornam públicas as manifestações de descontentamento.

O único ponto que une ainda o povo iraniano ao governo, é o apego ao islamismo. Mas que islamismo? Certamente, não o do ódio que hoje se prega, não o do terror, que o governo patrocina no Iraque e na Palestina, mas um islamismo que permite à nova juventude ler Lolita e se rebelar. Um islamismo sem terror que possa conviver com o Ocidente, como Kuwait, Emirados, Catar e Bahrein, hoje fazem. E logo ali, a alguns quilômetros de Teerã. Eles estão dando um exemplo de que existe uma convivência possível entre o islamismo com toda a sua severidade pouco racional, com outras civilizações e religiões.

PERDENDO PESO

Concluindo, a manter o clima atual, o Irã estará sozinho no Oriente Médio. É um país islâmico, mas não árabe. Sem investidores, reduzindo sua receita de petróleo, pesando cada vez menos no abastecimento mundial, pode transformar-se de grande exportador em importador de combustíveis. Enquanto isso, vai continuar com sua revoluçãozinha sangrenta de seitas.

Sabem, vou dizer um nonsense - e serei criticado por isso. Mas não fosse as questões humanitárias tão importantes, o Ocidente, se quisesse, poderia deixar que eles continuassem se matando entre si até cansarem. Afinal, não foi sempre assim? Quantas dezenas de milhares e xiitas Saddam Hussein não trucidou no seu longo reinado de terror?