Algumas considerações sobre a sacudida chinesa nos mercados. Há o que é conjuntural e o que é estrutural. É importante não tomar uma coisa pela outra. Vocês viram: a Bolsa de Xangai voltou a cair, arrastando as bolsas do mundo, também e de novo a brasileira, a que amarga, por enquanto, a maior perda. Vou fazer algumas considerações – não mais do que isso – de por que as coisas estão acontecendo assim e qual é o cenário que se desenha. A Bolsa brasileira vivia o seu melhor momento. Subia ininterruptamente havia quatro anos, o seu maior período de bonança. Antes, o marco era de três anos seguidos: 72,73 e 74 e 83, 84 e 85. Tratava-se de movimentos de recuperação: houve uma crise grave em 71 e outra em 82. Bem, e o que explicava o desempenho de agora? A China. Sim, ela mesma. Melhor dizendo: as commodities brasileiras, com preços que estão no pico. E estão justamente por causa do contínuo crescimento daquele país e também da expansão da economia americana, que vinha muito bem. Se eliminarmos o fator “preço” das exportações brasileiras – e voltarmos, digamos, aos que vigiam em 2003 -, nossas exportações seriam algo em torno de US$ 25 bilhões a menos, o bastante para mudar o sinal das transações correntes, que passariam de positivas a negativas. Entendam: não estamos exportando mais: estamos exportando a preços maiores. O extraordinário desempenho das exportações (e, pois, da balança) é fruto de um mundo que cresceu mais de 5%. É coisa pra chuchu. É consenso no mundo que o mercado chinês é uma caixa preta. Nem narcotráfico rende 120% ao ano. Em algum momento, essa correção haveria de acontecer. E parece que é agora. Some-se a isso o fato de que há sinais de desaquecimento dos EUA. Tradução: há risco de queda do preço das commodities. Onde isso é sentido primeiro? Na Bolsa. Mais na nossa do que na dos outros porque o país depende mais desse fator. Isso explica por que chegamos aqui. A questão agora é o futuro. O futuro Uma coisa è uma crise financeira, passageira, ainda que drástica, e outra, diferente, é uma crise econômica, digamos, de proporções mundiais, um crash generalizado. Ele está no horizonte? Não. O atual ciclo de expansão parece ter seu ponto de equilíbrio em dois, vá lá, desequilíbrios: o chinês (olhem a China aí de novo) e o americano. Os chineses trabalham para financiar os gastos dos americanos, que compram da China. Enquanto o gigante asiático precisar manter aquecido o mercado de trabalho, não parece que o mundo vá para a bancarrota. E aí há um dado fundamental: quase dois terços da população cinesa ainda está no campo – e uma parcela imensa, a exemplo do que ocorre nas economias mais avançadas – vai para as cidades. No Brasil, mais de 80% já está no meio urbano. Enquanto a China estiver se impondo o desafio da geração maciça de emprego, não parece que venha por aí uma crise realmente profunda. Mas mudou o cenário? Mudou. Aumentou a volatilidade? Os fatos falam por si. Aquele otimismo que se confundia com moto-contínuo perdeu a confiança? É claro. Só não parece que seja o Armagedom. O tamanho das perdas – e não do desastre – vai depender de até onde a China desacelera. E isso torna a Bolsa, especialmente no Brasil, menos segura. Mas nem mesmo parece que haverá uma pressão muito grande sobre o dólar – não a ponto de agradar a alguns setores que hoje são menos competitivos. E também não há razão para que a trajetória dos juros não continue declinante. E razoável o Brasil ficar preocupado, já que fabricou um crescimento medíocre quando tudo estava a seu favor? É, sim. Especialmente quando tenta emplacar um Plano de Aceleração do Crescimento. Quem sabe se esteja fabricando desde já uma nova desculpa: “Pô, tudo ia tão bem, mas sabem, aí veio a China...” |