O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) segue a prática de outras equipes econômicas, de fazer um bolo tendo como ingredientes muitas ações já em andamento, coberto por algumas novidades para torná-lo mais atrativo e servir à inscrição de novo e pomposo nome.
Assim, dos R$ 287 bilhões de recursos da União e de suas empresas estatais destinados “pelo programa” a investimentos em infra-estrutura no período 2007-2010, R$ 219,2 bilhões serão dessas empresas, com destaque para a Petrobrás, que investirá R$ 171,7 bilhões nesse período. Segundo ela, o PAC inclui 183 projetos já listados em seu planejamento do período 2005(!)-2011. No caso dos recursos que virão do orçamento fiscal e da Seguridade Social, totalizando R$ 67,8 bilhões, apenas R$ 11,5 bilhões são de recursos novos para o ano corrente.
Para chegar à cifra total de R$ 503,9 bilhões de investimentos em infra-estrutura previstos pelo PAC no quadriênio a que se refere, o governo aposta em R$ 216,9 bilhões de investimentos privados, que para serem efetivados exigirão muito engenho e arte governamentais e de empresários. Segundo matéria deste jornal na terça-feira (B7), que ouviu empresários ligados à infra-estrutura, “o PAC não trouxe nenhuma novidade em relação a novos projetos. Todos fizeram parte de apresentações de governos passados(!) e até mesmo do atual, quando lançou o programa de Parceria Público-Privada (PPP)”. Ou seja, há uma continuidade entre governos, de não-efetivação de seus planos. Um dos empresários ouvidos, Saturnino Sérgio da Silva, diretor da Fiesp, disse que a entidade quer criar um “índice de efetividade das medidas”.
Entre elas, destaca-se grande número de incentivos fiscais, particularmente na forma de redução de impostos. Vi lista com 11 incentivos desse tipo, dois deles também já ingredientes do bolo, a nova Lei das Micro e Pequenas Empresas e a recente correção da tabela do Imposto de Renda (IR) das pessoas físicas. Com exceção desta última, são medidas setoriais voltadas para essas empresas, para investimentos em infra-estrutura e para o setor de tecnologias de informação e de comunicação, neste caso incluindo estímulos à adoção da TV digital, à indústria de semicondutores e à aquisição de computadores. Assim, são medidas tipicamente microeconômicas, pois que setoriais.
Ainda que muito restritas no seu valor e sem alcance mais geral, elas são bem-vindas, principalmente levando em conta a asfixiante carga tributária do País. Esta funciona como ingrediente de outro bolo, o da produção da economia, no qual o efeito de seu exagero prejudica os investimentos e a renda disponível dos contribuintes, contendo o crescimento da produção e solando esse bolo.
A fragilidade do PAC está em seus fundamentos macroeconômicos, e não tanto nessas medidas microeconômicas. Estas, aliás, poderiam ter vindo com alcance bem mais amplo, setorialmente e no seu valor, não fosse a fragilidade daqueles fundamentos.
Nessa linha, o PAC nasceu fragilizado pela insistência governamental, no primeiro mandato do governo Lula, de permitir a contínua elevação da carga tributária e de promover forte expansão dos gastos públicos de custeio. Só agora esse governo acordou para a necessidade de ampliar os investimentos públicos e de criar um clima adequado para o crescimento dos investimentos privados, mas ainda com grandes riscos de voltar ao seu sono populista e distributivista.
Recorde-se que na última vez que o lançamento do PAC foi adiado, no final de 2006, isso ocorreu porque os números do programa precisaram ser refeitos. Em particular, o novo e forte aumento do salário mínimo, então decidido, contribuiu para reduzir fortemente o valor dos incentivos fiscais setoriais que inicialmente o plano contemplava.
Na formulação do PAC, a deletéria ação fiscal do governo na esfera macroeconômica também se manifesta de outras formas, pois, salvo os próprios e poucos investimentos adicionais e esses incentivos de pequeno impacto nessa esfera, o contínuo crescimento da carga tributária não foi tratado e a contenção de despesas, como a da folha do funcionalismo e dos benefícios previdenciários ligados ao salário mínimo, se limitou a “conter o seu crescimento real”. A discussão da reforma tributária ficou de ser retomada, sem nenhum compromisso com a redução de carga, e a reforma da Previdência ficou por conta de um fórum nacional para discutir o assunto.
É essa fragilidade da ação fiscal que também impedirá a melhoria mais rápida e forte dos resultados das contas do governo, conforme contemplados pelo PAC, em termos de um déficit final menor, ou mesmo zerado, e de uma redução de seu endividamento como proporção do produto interno bruto (PIB). Isso é que abriria a perspectiva de uma redução mais acelerada da taxa básica de juros, algo fundamental quando se fala em crescimento, mas desprezado pelo PAC nos seus fundamentos macroeconômicos.
Mesmo levando em conta essas limitações, é possível que no final deste ano o governo comemore, à sua maneira, um “resultado do PAC”. O crescimento da economia no ano passado foi particularmente frágil, estimado em 2,73% pelo mercado financeiro. Antes do PAC, esse mesmo mercado já previa um crescimento de 3,5% do PIB em 2007, que, se materializado, significará uma aceleração do crescimento, ainda que pequena e a partir de uma taxa muito baixa. O PAC, contudo, é afirmativo ao confiar no seu impacto e prever um crescimento de 4,5% em 2007 e de 5% nos três anos seguintes. É relativamente a esses números, e a outros de suas muitas previsões, que o PAC deve ser adequadamente avaliado.