terça-feira, janeiro 02, 2007

Eliane Cantanhede - Chovendo no molhado




Folha de S. Paulo
2/1/2007

Choveu torrencialmente em Brasília ontem, mas Lula é tão sortudo que a chuva arrefeceu justamente às 16h, quando ele subiu no Rolls Royce para o desfile em carro aberto da sua posse.
Talvez tenha nisso um prenúncio do que vem por aí, apesar das apostas maniqueístas entre os que prevêem um fiasco ou, no lado oposto, um sucesso absoluto. O mais prudente é imaginar um "novo" governo igual ao anterior, com as mesmas qualidades, os mesmos defeitos, chovendo no molhado.
Do alto de sua vaidade e de sua autoconfiança, Lula não se deu o trabalho de tomar posse com uma nova equipe. Pretextos há muitos (esperar o pacote econômico e a eleição das Mesas do Congresso...), mas a verdade costuma ser mais simples: ele não quis mediar disputas, agradar uns poucos, desagradar muitos, todas essas chatices. O que importa no governo Lula é Lula. O resto se vê depois.
É assim que o presidente vai repetindo o primeiro mandato, que chegou ao fim com seis ministros do segundo escalão que foram ficando, ficando e acabaram ficando mesmo. Quem é mesmo o ministro da Saúde? É como o tal pacote, que ocupa páginas e páginas de rascunhos e de jornais há meses, mas não saiu do papel. Sem pressa, Lula contenta-se com a popularidade, a boa vontade, uma espécie de carta branca sem prazo.
No primeiro mandato, Lula agüentou firme as pressões para sacudir a economia. No final, os elogios superaram as críticas em artigos, colunas, comentários, arquivando a falácia de que os jornalistas são anti-Lula e contra o governo. Os aliados e os amigos foram os grandes algozes. A imprensa reproduziu o dano que eles fizeram.
Os desafios concentram-se na necessidade de produzir e distribuir riqueza de forma consistente, além de combater o crime organizado. Crescer e estancar a guerra urbana são dois desafios de vida ou morte.