editorial |
O Estado de S. Paulo |
28/12/2006 |
Na falta de um bom exemplo do governo federal, coube ao governador do Espírito Santo, Paulo Hartung, propor a seus colegas um pacto de seriedade para facilitar o investimento e o crescimento econômico. Se o Palácio do Planalto não tem condições para defender a reforma da Previdência, depois de rejeitar a idéia na campanha eleitoral, os governadores devem tomar a iniciativa. Eles poderão reativar a pauta reformista, se estiverem dispostos a cuidar de questões de interesse nacional e suprapartidário. A sugestão é ousada e otimista, pois atribui aos governadores uma responsabilidade muito mais ampla que a administração estadual. Mas não se pode acusá-lo de irrealismo: qual o progresso possível para cada Estado, quando a economia nacional é emperrada pelo déficit previdenciário, pelas contas federais engessadas e pela rigidez das normas trabalhistas? As sugestões do peemedebista Paulo Hartung, reeleito em primeiro turno com 77,3% dos votos, foram apresentadas numa entrevista ao jornal Valor. Envolvem dificuldades políticas, mas são essencialmente pragmáticas. Implicam, em primeiro lugar, uma alteração radical na lista de reivindicações dos governadores. Vários têm defendido o afrouxamento de regras para as finanças públicas. O governador capixaba propõe o contrário. Segundo ele, todos deveriam tomar como cláusulas pétreas a Lei de Responsabilidade Fiscal e os compromissos assumidos com o Tesouro da União, nos anos 90, quando os débitos de Estados e municípios foram renegociados. Afrouxar as cláusulas da lei e do refinanciamento seria um retrocesso, segundo Hartung. Ele está certo nessa avaliação. A Lei de Responsabilidade Fiscal e a renegociação das dívidas não foram medidas de alcance conjuntural. Foram concebidas para mudar os padrões das finanças públicas. Se não forem renegadas, serão lembradas, historicamente, como eventos políticos de primeira grandeza. Esses marcos, no entanto, só serão consolidados quando forem aceitos como componentes da vida rotineira, tão normais e necessários quanto regras de trânsito. A partir daí, serão irreversíveis e os padrões mínimos da responsabilidade fiscal funcionarão como firmes balizas da vida política. Esse momento ainda não chegou e por isso as palavras do governador são tão oportunas. Há dificuldades financeiras em alguns Estados, admite Hartung, e é possível ajudá-los sem afrouxar as leis fiscais. Ele menciona como exemplo a antecipação de royalties do petróleo ao Espírito Santo, em 2003. Mesmo expedientes como esse, é preciso acrescentar, podem ser perigosos, se forem usados meramente para contornar, de forma disfarçada, as normas de endividamento dos Estados. Mas sempre haverá riscos desse tipo e cuidados excepcionais serão sempre necessários para não se desmoralizar a lei. O governador capixaba exclui da pauta de reformas, no entanto, a mudança tributária. Neste momento, segundo ele, não há espaço para alterações desse tipo. Para mudar de forma efetiva o sistema, seria preciso mexer no Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, o principal tributo dos Estados. Em sua avaliação, a alternativa realista será conter o gasto público para em seguida cuidar da redução da carga tributária. Quanto à despesa pública ele tem razão. É irrealista pensar na desoneração fiscal e ao mesmo tempo manter - ou, pior, aumentar - a proporção entre os gastos governamentais e o Produto Interno Bruto (PIB). Esse aumento voltará a ocorrer, provavelmente, em 2007. Mas, sem um plano de reforma, a desoneração do setor produtivo continuará a depender de medidas improvisadas e muitas vezes destinadas a favorecer setores empresariais ou grupos de empresas selecionados arbitrariamente. Soluções desse tipo são raramente eficazes para o conjunto da economia e com freqüência injustas. O mais conveniente é manter na agenda a reforma tributária, substituindo, talvez, o projeto em tramitação no Congresso, considerado defeituoso por especialistas de competência reconhecida. Se o compromisso com essa reforma for simplesmente suspenso, nos próximos quatro anos, os governadores que serão eleitos em 2010 também terão desculpas para adiar o tratamento do problema. |