O crescimento deve mesmo ficar em 2,8% ao ano, número muito inferior ao sonho de 4% vivido pelo governo
O IBGE divulgou ontem os números do PIB para o terceiro trimestre do ano. Com isso, já conhecemos a performance de nossa economia nos nove primeiros meses de 2006, tempo suficiente para o início de uma leitura do resultado final no último ano do primeiro mandato do presidente Lula. Os números do IBGE permitem também uma descida às entranhas da economia brasileira e uma análise mais qualitativa de seu comportamento nesse período.
O crescimento do PIB deve mesmo ficar em 2,8% ao ano, número muito inferior ao sonho de 4% vivido pelo governo e mantido de maneira quase envergonhada durante a campanha eleitoral de outubro último.
Com isso, o crescimento per capita será da ordem de 1,2% ao ano em todo o primeiro mandato de Lula, ou seja, nesse ritmo, o brasileiro vai precisar de 60 anos para dobrar sua renda, que é hoje da ordem de R$ 950 ao mês. Nesse período, o PIB brasileiro cresceu apenas 2,6% ao ano em média, muito abaixo do crescimento mundial de 4,8% ao ano no mesmo período. É verdade que no governo FHC o Brasil cresceu um pouco menos, 2,3% ao ano em média, mas o resto do mundo teve desempenho bem pior que o dos últimos quatro anos, ao crescer apenas 3,6% ao ano.
Ou seja, a distância do Brasil para o resto do mundo aumentou muito no governo Lula, um quadro bem diferente daquele que o discurso oficial procura vender à sociedade. Se compararmos nosso crescimento per capita no período 2003/ 2006 ao da economia mundial, calculado pelo FMI, constatamos que andamos para trás de forma incrível.
Esse sentimento de mediocridade fica reforçado se tomarmos o crescimento médio de algumas economias emergentes de 8% nesse mesmo período. Se fizermos essa mesma comparação para um período de 20 anos, chegaremos quase ao desespero.
Mas vou poupar meu leitor desse verdadeiro exercício de masoquismo e ficar com os números mais recentes.
Essa situação de inferioridade não é de agora, pois crescemos menos que as economias emergentes também no período FHC. Estamos, portanto, diante de um problema estrutural e que o governo do PT, apesar de todo o seu discurso voluntarista e ufanista, não conseguiu resolver mesmo sob condições muito mais positivas que as enfrentadas por FHC. Voltarei a essa questão nas próximas semanas.
Olhando mais detalhadamente os números recém-divulgados pelo IBGE, podemos tirar algumas conclusões interessantes. Nos primeiros nove meses do ano, em relação ao mesmo período do ano passado, o consumo das famílias cresceu a uma taxa anual de 3,7%, e o do governo, a 1,9%. Já o investimento em capital fixo aumentou 6%. Mas o comércio exterior subtraiu um ponto percentual do crescimento, em razão de um aumento de 16% no volume das importações, contra apenas 5,3% das exportações.
Em relação aos principais setores da economia, a indústria continuou a ser o destaque negativo no ano, refletindo principalmente o impacto do aumento das importações: cresceu 0,6% no trimestre em relação aos três meses anteriores e apenas 2,4% nos 12 meses encerrados em setembro em relação aos 12 meses anteriores. Os números do IBGE confirmam o quadro que temos apresentado sistematicamente ao leitor da Folha e reforçam nosso diagnóstico sobre a impossibilidade, nas condições atuais, de ambicionarmos nos próximos anos um crescimento econômico mais acelerado.
Evidência adicional dessa incapacidade de crescermos está no comportamento de nosso mercado de trabalho. As estatísticas sobre os salários formais contabilizadas no Caged, do Ministério do Trabalho, mostram um quadro perigoso. Em 2005, os contratos de trabalho com remuneração até três salários mínimos adicionaram R$ 8,7 bilhões à massa salarial total, enquanto a redução do emprego entre os que ganham mais de três salários mínimos subtraiu R$ 5,6 bilhões. Está claro que um bom pedaço do aumento de vagas formais não representa criação de novos empregos e, além disso, há um achatamento da renda nos extratos médios da população.
Essa tendência, que continua em 2006, mostra que estamos destruindo contratos de trabalho com remuneração mais elevada e criando empregos apenas nas faixas de menor valor e de menor qualificação profissional. Essa é a resposta natural das empresas ao péssimo ambiente de negócios existente no Brasil. O salário médio das admissões registradas no Caged é hoje equivalente a 1,8 salário mínimo, contra três salários mínimos registrados em 1998/1999. Essa dinâmica no mercado de trabalho, em uma economia de mercado, é um sinal inequívoco de uma economia sem energia e dinamismo.