A pergunta-título desse artigo integra o rol de interrogações que políticos, jornalistas e analistas se fazem quando observam governantes em final de mandato. Lula conquistou a reeleição e, ao que tudo indica, tem sua estratégia política e de marketing com a qual pretende marcar seu novo período de governo. FHC foi o primeiro caso de reeleição democrática de um presidente no Brasil. Considero suas três grandes realizações a política de estabilização monetária, da qual faz parte inseparável a Lei da Responsabilidade Fiscal, e a privatização das telecomunicações. Sua marca mais forte é o Plano Real e o fim da inflação, obra sujeita à expropriação por Lula, que vem se gabando de ter estabilizado a economia. Considero o maior erro de FHC, e sua dívida política com os brasileiros, o abandono da Reforma do Estado, que ele trocou pela busca da reeleição às custas de um desgaste de imagem da qual não vai mais se recuperar. A imagem residual do governo FHC é ruim. As pesquisas atestam que o povo vê as privatizações como sinônimo de corrupção e considera o governo FHC pior do que o de Lula. As pesquisas do início do segundo mandato de Lula indicam popularidade alta. Segundo o Ibope, 71% dos brasileiros nutrem expectativas positivas em relação ao segundo mandato de Lula. No artigo “Governo Lula II: de onde vem tanta popularidade?”, publicado dia 21/12, atribuí ao projeto bolsa-família grande parte da imagem positiva do governo Lula. Paralelamente, ao se beneficiar da valorização do Real que permitiu a recuperação parcial do poder de compra da população, corroído pela desvalorização da moeda praticada por FHC no início de 1999, foi a satisfação da expectativa de que o PT no poder “faria pelo social” que alavancou a reeleição de Lula. Do ponto de vista do interesse nacional há uma agenda de reformas estruturais pendente para que o país possa se inserir de forma competitiva na economia globalizada. Modernização da gestão pública; novas privatizações e extinção de órgãos público com duplicidade de funções; Reforma Tributária; Reforma Sindical e Trabalhista; Reforma da Previdência; Reforma Política e revisão do pacto federativo, aumentando a autonomia política, administrativa e financeira de municípios e estados em relação à União, dentre outras, integram a pauta dessa agenda. Pelo que se percebe a partir de declarações e atitudes do presidente, talvez apenas uma insuficiente Reforma Tributária faça parte da agenda de Lula. No balão de ensaio lançado à mídia, o governo pretenderia criar o IVA, que substituiria uma cesta de tributos que incide sobre a produção por um imposto que incide sobre o consumo. O projeto de Reforma Tributária hoje em tramitação no Congresso prevê apenas a simplificação das alíquotas de ICMS, que seriam reduzidas a 5, em detrimento das 27 alíquotas existentes nos estados hoje. A criação do IVA está em consonância com os modernos sistemas tributários existentes no mundo desenvolvido. Se é que o governo tem a intenção de criá-lo mesmo, convém alertar para o fato de que, toda a vez que os governos propuseram mexer nas leis sobre impostos, o resultado foi o aumento da carga tributária e da concentração da arrecadação nas mãos da União, na contramão do que se recomenda segundo as tendências de modernização do sistema tributário das economias mais competitivas. O presidente Lula já declarou abertamente que não vai fazer Reforma da Previdência, ainda que o rombo nas contas da Previdência seja a principal causa do déficit público, que os governos têm coberto com aumentos da carga tributária e política de juros elevados. A Reforma Política foi, na prática, sepultada pela decisão do Poder Judiciário, que declarou inconstitucional a cláusula de desempenho (erradamente chamada de cláusula de barreira pela mídia). Além disso, essa reforma padece do mesmo mal que a Reforma Tributária. Isto é, todo mundo se declara a favor, mas como sua aprovação implica em redistribuição de poder – e no caso da Reforma Tributária, redistribuição de recursos entre as unidades federadas -, na hora de elaborar o Projeto de Lei e botar a tramitar, o consenso se mostra impossível e o impasse se mostra inevitável. Ninguém quer perder poder e dinheiro. As reformas Sindical e Trabalhista são fundamentais para a modernização e aumento da competitividade da economia. Desde a Constituição de 1988 discute-se a necessidade de desvincular os sindicatos do Estado, acabar com o imposto sindical e liberar o direito de criação de mais de um sindicato por ramo industrial. Isso acabaria com os sindicatos cartoriais e abalaria o poder das corporações, cuja pressão política sobre o Estado produz a obtenção de vantagens para essa elite, em detrimento do investimento público em políticas infra-estruturais e de redução de pobreza. A Reforma Trabalhista visa reduzir os custos da contratação de trabalhadores e simplificar a legislação para permitir a redução do desemprego. Lula não vai afrontar as corporações sindicais, pela mesma razão que não pretende reforma a Previdência. Ele prefere preservar sua imagem e suas alianças com as corporações sindicais, que estão dentro do seu governo. Lula também não vai privatizar nem reduzir o tamanho do Estado e seu custo tributário para a sociedade. Certamente o governo petista não vai reverter privatizações, pois tal medida é financeiramente inviável. A menos que queira afrontar os agentes econômicos internacionais e imitar Evo Morales, que nos rouba a Petrobrás sem indenização. Pelo contrário, o que se viu foi Lula aumentar a carga tributária e o tamanho do Estado no primeiro mandato. Voltamos, então, à pergunta-título desse artigo. Lula adoraria fazer a economia crescer 5% do PIB ou mais nos seus quatro anos de mandato restantes. Impossível. As bases de sua política econômica não permitem que isso ocorra, a não ser sazonalmente, e o estrangulamento da infra-estrutura traria o caos dos aeroportos para outros setores envolvidos na matriz logística do país, que requer tempo e investimentos para ser modernizada. Resta, portanto, a Lula, investir na imagem de um presidente que fez pelo social. Para isto, basta-lhe manter as bases da política econômica que lhe viabilizou a reeleição e a ampliação da clientela do bolsa-família, do Prouni e de outros projetos com impacto social positivo sobre sua imagem. Trivial, variado e sem surpresas. Seu objetivo, não tenhamos ilusões, será, na carona dessa equação política e de marketing, construir um nome petista umbilicalmente ligado a ele para sucedê-lo no governo. |