O Estado de S. Paulo |
31/10/2006 |
Assim como, em 1989, o cientista político americano Francis Fukuyama decretou o fim da História, domingo o ministro Tarso Genro decretou "o fim da era Palocci" na condução da política econômica do governo Lula. Esse movimento de peão no tabuleiro político deve ser entendido como senha para a deflagração de uma guerra de foices dentro do PT pelo controle da economia. Ninguém ignora que o PT sempre foi contra os compromissos da Carta ao Povo Brasileiro que o presidente Lula assinou em junho de 2002 em defesa de políticas responsáveis como base para ir mais longe. As políticas fiscal, monetária e cambial adotadas no período 2003-2006 nunca foram unanimidade dentro do governo Lula. Melhor dizer que mais da metade do ministério sempre foi contra. No entanto, apesar de tudo e de todas as pressões em contrário, o presidente Lula manteve o rumo. Qual é a probabilidade de que mude agora? Não é tão simples mudar tudo o que foi consolidado nos últimos quatro anos. Não bastaria definir que o Banco Central receberia agora instruções para derrubar os juros. No mínimo, seria preciso mudar a política de metas de inflação. Quem pensa que bastaria entronizar no Banco Central uma equipe mais ousada ou que cumprisse ordens superiores para que o crescimento econômico viesse a cavalo parte do pressuposto de que o que houve até agora foi apenas um erro de dose na definição dos juros e que esse erro prejudicou decisivamente o crescimento econômico. Houvesse apenas um erro de dose, seria fácil corrigi-lo. Nessas condições, os juros básicos, hoje nos 13,75% ao ano, cairiam, digamos, para alguma coisa em torno dos 11% ao ano. Mas, decisivamente, não seria esse afrouxamento na distribuição de crédito e de dinheiro que, por si só, tiraria o atraso. O que essa ala do PT e da sociedade brasileira pretende é desativar o sistema de metas de inflação, tal como funciona hoje. Para essa gente, o governo passaria a ter metas de crescimento econômico às quais o tamanho dos juros teria de se conformar. Para isso, o Banco Central não poderia ter autonomia, como tem hoje, de maneira a que pudesse, sem interferências, calibrar a oferta de dinheiro à meta de inflação. Teria de cumprir ordens dos políticos e os políticos estão sempre interessados em gastar verbas públicas, não importando se existem ou não. Na semana passada, essa ala plantava nos jornais a informação de que o atual presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, só ficaria no segundo mandato Lula se concordasse em trocar alguns diretores do Banco Central. Confirmada a vitória do presidente Lula, já sustentam que o Banco Central será obrigado a derrubar os juros para níveis a serem decididos por instâncias superiores e, nessas condições, deixaria de ser diretamente responsável pela política monetária. Apesar de pressões desse tipo, ao longo de todo o seu governo o presidente Lula não só manteve a política econômica tal como definida desde o início do mandato, como garantiu autonomia operacional de fato ao Banco Central. Aparentemente, ficou satisfeito com os resultados obtidos porque a todo momento não cessou de exaltá-los, como base para o crescimento sustentado. Mais do que isso, pareceu convencido de que sua vitória, nas proporções verificadas, só foi possível porque a política adotada garantiu o fortalecimento do poder aquisitivo do eleitor. Em princípio, a qualquer momento o governo pode entender que as atuais diretrizes devam ser radicalmente mudadas. Nesse caso, teria de ser emplacado novo modelo econômico e não apenas trocadas as pessoas. Se a prioridade fosse cumprir metas de crescimento, seria em torno desse eixo que todas as demais políticas se comporiam. Mudanças dessa ordem exigiriam certo grau de criatividade, porque em país nenhum a política econômica se equaciona a partir de metas de crescimento econômico. Em outras oportunidades, quando isso foi sugerido, o presidente Lula preferiu dizer que isso não se faz nem com mágicas nem com invencionices. Em todo caso, quando o presidente Lula divulgar sua nova equipe já será possível inferir as diretrizes a serem adotadas. Por ora, convém dizer que a probabilidade de grandes mudanças parece baixa. |