sábado, outubro 28, 2006

Bom de coração

Não se podem desprezar os efeitos do LDL,
o mau colesterol. Mas os médicos defendem
agora que o mais importante é aumentar os
níveis de HDL, o colesterol do bem

Anna Paula Buchalla


Desde 1961, quando o colesterol alto foi identificado como um dos maiores inimigos da saúde cardiovascular, os médicos empreendem esforços para reduzir os níveis de LDL, o mau colesterol, em seus pacientes. Na primeira diretiva, o LDL não podia ultrapassar 240 miligramas por decilitro de sangue. Hoje, o limite aceitável é de 160 para quem não apresenta outros fatores de risco de infartos e derrames. Aos que exibem um histórico cardíaco complicado, a recomendação é que os níveis do colesterol ruim não excedam 70 miligramas. Para atingir um patamar tão baixo, além da dieta balanceada e dos exercícios físicos, só mesmo recorrendo ao uso de remédios, sobretudo as estatinas – os medicamentos que revolucionaram a prevenção e o tratamento do colesterol alto. Na última edição da revista científica Annals of Internal Medicine, contudo, uma equipe de pesquisadores da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, questiona a recomendação de que o ideal seja um LDL menor do que 70. Depois de analisarem os principais estudos que relacionam o mau colesterol à saúde do coração, eles concluíram que não há validade científica para essa meta. O limite de 100 miligramas por decilitro de sangue já seria suficiente, de acordo com a revisão. Há também uma corrente de médicos que defende que, sem subestimar o impacto negativo do LDL, o mais importante é aumentar os níveis de HDL, o bom colesterol. De fato, altas taxas da substância – mais de 50 miligramas em mulheres e mais de 40 em homens – estão associadas a uma diminuição significativa do risco de doenças cardiovasculares. A cada 1% de aumento do HDL, há uma queda de 3% nas probabilidades de ocorrência de distúrbios cardiovasculares.

Enquanto o LDL é a principal fonte do acúmulo de gordura nas artérias, o HDL "varre" o colesterol ruim de dentro delas. Recentemente, no entanto, se descobriu que o HDL é mais do que um mero lixeiro de gordura. Ele também exerce funções antioxidantes e antiinflamatórias – suas moléculas protegem a parede dos vasos e impedem o surgimento das lesões que facilitam o depósito de gordura nas artérias. Descobriu-se ainda que ele também conta com poderes anticoagulantes, o que ajuda a evitar a obstrução arterial. Portanto, quanto mais HDL, melhor. Pessoas longevas, que ultrapassam a barreira dos 90 anos, costumam ter HDL acima de 60. "O fato é que, por mais reduzidos que sejam os níveis de LDL, se o HDL também for baixo, o risco permanece alto", diz o cardiologista Raul Dias dos Santos, diretor do setor de lípides do Instituto do Coração, em São Paulo. O curioso é que as bases que sustentam a tese de que o HDL alto é tão ou mais importante do que o LDL baixo se encontram em um estudo epidemiológico que está para completar sessenta anos: o realizado com a população da cidade americana de Framingham, em 1948. De acordo com esse levantamento, homens com HDL menor do que 52 têm o dobro de risco de infartar, quando comparados com aqueles com HDL acima desse patamar. Entre as mulheres, a probabilidade de um evento desse tipo, nessas condições, é quatro vezes maior. Elas, aliás, são as que mais sofrem com os efeitos de um HDL baixo. Ainda não há explicação para esse fato, mas supõe-se que, como o sexo feminino possui naturalmente uma quantidade maior do bom colesterol, quando ele míngua o impacto negativo de sua falta é maior.

Entre os principais fatores de risco para o coração, a hipertensão é o mais prevalente, porém o controle do colesterol tem um impacto muito maior na prevenção dos distúrbios cardiovasculares. Ao manter a pressão arterial em parâmetros adequados, reduz-se o risco em cerca de 15%. Já com a redução do colesterol ruim, diminui-se a incidência de infartos e derrames em 30% a 50%. Controlar o LDL é mais fácil do que aumentar o HDL, pelo menos por enquanto. Contra o excesso de LDL existe uma série de medicamentos, dentre os quais se destacam as estatinas. Algumas delas têm a capacidade de aumentar o HDL entre 5% e 10%, mas isso é relativamente pouco. Os remédios mais efetivos nesse sentido são a niacina e os fibratos. A niacina pode aumentar o HDL em até 35%. O problema é que seus efeitos colaterais são severos, especialmente o rubor facial. Com os fibratos, o aumento costuma ser de 10% a 15%. A indústria farmacêutica agora investe no desenvolvimento de medicamentos capazes de aumentar de forma mais consistente o HDL – entre os quais, uma niacina que não cause reações adversas e uma vacina (veja quadro).

Enquanto a farmácia pró-HDL não está à disposição, a melhor forma de aumentar as taxas do colesterol bom é livrar-se do excesso de triglicérides (um tipo de gordura) no sangue. "Os triglicérides têm uma relação muito estreita com o HDL", diz a cardiologista Tânia Martinez, do Instituto do Coração. "Os altos índices desse tipo de gordura estão associados a uma queda nos níveis de HDL." Para tanto, é indispensável a prática regular de exercícios aeróbicos, como corrida, natação e caminhada, de três a quatro vezes por semana. Para quem está acima do peso, um bom regime ajuda a aumentar o HDL em até 20%. Nos últimos anos, passaram a ser vendidos também alimentos enriquecidos com substâncias capazes de elevar o HDL e reduzir o LDL – existem desde margarinas com fitosteróis até pães e ovos com ômega-3. Ômega-3, aliás, é bom para chuchu. O tucano Geraldo Alckmin não dispensa a substância em sua dieta.



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Fotos Photodisc, Eduardo Pozella, Frederico Busch e Ormuzo Alves