quinta-feira, setembro 28, 2006

Freud e a mala Por Reinaldo Azevedo

No bate-papo com Diogo (ouça no Podcast do Diogo Mainardi, clicando aqui e veja nota abaixo), ele me lembra a reportagem publicada pela Veja em que se informa que Freud Godoy, segurança e faz-tudo de Lula, acompanhava Delúbio Soares, aquele do mensalão, nas operações que envolviam dinheiro vivo. É um dos textos que compõem as matérias especiais da revista desta semana sobre o dossiegate. Leia, abaixo, a íntegra da reportagem, assinada por Policarpo Junior, cujo título é “O Guarda-malas do Planalto”. Infelizmente, parece que o resto da imprensa não se interessou pelo caso. Importante na vida de Lula e na sua rotina, o tal Freud, sem dúvida, é. No filme Entreatos, por exemplo, nos momentos de maior intimidade e descontração do então candidato, lá está o auxiliar, íntimo, amigo de fé, irmão, camarada...
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O assessor especial do presidente Lula, Freud Godoy, era, até a semana passada, um ilustre desconhecido. Além de amigo e ex-segurança do presidente, pouco se sabia sobre suas atividades, a não ser o fato de que era uma espécie de faz-tudo no Palácio do Planalto. Freud Godoy, sabe-se agora, era muito mais que um mordomo de luxo. Apontado como o homem encarregado de supervisionar a parte final da operação de compra do dossiê tucano, ele se demitiu. Antes, confirmou que esteve com o ex-policial preso com as malas de dinheiro, mas disse que nada sabia sobre a história do dossiê. Suas atividades no Palácio, afirmou, se limitavam às tarefas típicas de qualquer empregado doméstico. Não eram. Freud é um personagem capital do submundo petista. Além de ter recebido 98 500 reais do valerioduto, Freud é responsável, entre outras coisas, pela segurança de todas as operações consideradas de risco do PT, principalmente as que envolvem dinheiro. Até explodir o escândalo do mensalão, em maio do ano passado, o ex-assessor especial do presidente coordenava pessoalmente a segurança do tesoureiro Delúbio Soares – o homem da mala da república petista.

Freud Godoy tinha seu gabinete no mesmo andar que o presidente da República. Ele também é dono da Caso, empresa de segurança de São Paulo, em cuja sede não há funcionários nem expediente regular. Há anos seu cliente é o PT. Ao se instalar no Palácio do Planalto, Freud passou o comando da empresa para sua mulher, Simone Godoy, mas continuou atuando como homem de segurança do partido. Em 2004, foi encarregado de cuidar da guarda pessoal de Delúbio. Selecionou pessoalmente seis policiais militares em São Paulo para integrar a equipe de proteção. Pagava a eles entre 1 000 e 1 300 reais. Foi a partir dessa época que Delúbio passou a andar por São Paulo em carro blindado, escoltado por policiais motoqueiros. O partido justificava o esquema de segurança montado por Freud como procedimento normal de prevenção. A preocupação era outra. Delúbio estava em pleno exercício de suas funções de tesoureiro, um frenesi de ilegalidades que mais tarde seria parcialmente revelado por investigações do Congresso.

VEJA ouviu dois seguranças que trabalharam com Delúbio nesse período. Na presença de três testemunhas e antes da eclosão do escândalo do dossiê, eles disseram ter sido contratados pela empresa de Freud. Como são militares da ativa, tinham a segurança de Delúbio como "bico". Por isso, não havia registro em carteira. Os seguranças só concordaram em conversar na condição de não ter o nome revelado. Temem uma punição funcional. Cuidadosos, eles anotavam os roteiros percorridos. Há registro de encontros "sigilosos" de Delúbio com o presidente Lula em São Bernardo do Campo. O que mais chama atenção nas histórias narradas pelos seguranças, porém, é a presença quase constante de malas de dinheiro, o que se tornou um símbolo da atuação dos petistas no governo. Os seguranças contam que a comitiva do tesoureiro do PT se deslocava com freqüência ao Aeroporto de Congonhas para pegar e levar malas. Desconhecem o destino das que iam ou a origem das que chegavam, mas sempre havia uma mala para pegar ou levar ao aeroporto.

Os roteiros anotados mostram que na véspera da intervenção federal no Banco Santos a comitiva de Delúbio fez uma visita ao prédio. O tesoureiro permaneceu no banco por alguns minutos e voltou com uma mala. Embora não tenham examinado o conteúdo, os seguranças foram avisados de que estava cheia de dinheiro. Eles anotaram a operação como "transporte de dinheiro". É curioso que isso tenha acontecido. No horário da visita do tesoureiro, o banco já havia encerrado o atendimento aos clientes. Em outra operação, em vez de mala, o dinheiro andava em envelopes. Um dos seguranças contou que recebeu a missão de levar um envelope com dinheiro a um homem que aguardava na suíte de um hotel. A data, o hotel, o número do quarto estão anotados na agenda dos seguranças. Alguma semelhança com o escândalo da compra do dossiê? A diferença é que, nesse caso, ninguém foi preso. O esquema de segurança de Delúbio foi desativado por Freud depois do escândalo que revelou que "nosso Delúbio", como a ele ainda se refere o presidente Lula, era um trambiqueiro. Ele, suas malas e seu guarda-malas.”