segunda-feira, agosto 28, 2006

EUA devem abrir mercado para etanol


Artigo - Jorge L. Arrizurieta
Gazeta Mercantil
28/8/2006

Combustível cria oportunidade sem paralelos para o comércio mundial. Apesar de boa parte do mundo do comércio estar ocupada com os esforços para viabilizar a Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio, há uma oportunidade para que as nações em nosso hemisfério desenvolvam parcerias benéficas de longa duração em torno de uma commodity cuja demanda está explodindo: o etanol.
Com ou sem Doha, o vasto potencial de produção e desenvolvimento do etanol tem criado uma oportunidade sem paralelos para o comércio. O produto servirá para beneficiar os setores de transporte e agricultura, agora amarrados à negociação da Rodada, fortalecer parcerias hemisféricas, incentivar um movimento mais amplo de livre comércio e enfocar a segurança energética da região. O desenvolvimento de uma "Iniciativa de Segurança Energética Hemisférica" por meio de uma Parceria de Etanol do Hemisfério Ocidental teria tremendo impacto econômico, energético e comercial nos EUA e além de nossas fronteiras.
O fato de a importação de petróleo estrangeiro pelos EUA colocar nossa economia e nossa segurança em risco já está bem documentado. Com dois terços das necessidades de consumo de petróleo em nossa nação atendidos por importações, os EUA estão em uma posição precária, pois os preços do petróleo atingem recordes e as regiões produtoras enfrentam crescentes turbulências e ameaças de agitação e sabotagem por terroristas.
A Administração de Informação de Energia dos EUA prevê que o consumo de petróleo aumentará, por ano, em 270,7 mil barris ao dia de 2005 a 2015. A produção doméstica chegará a um pico em 2016 e depois começará a declinar.
Apesar dessa situação, as políticas tarifárias dos EUA não se ajustaram à nova realidade energética. O petróleo entra no país livre de tarifação, enquanto o etanol sofre pesada tributação. À medida que a demanda por etanol crescer, aumentará a pressão para corrigir esse desequilíbrio.
O etanol tem desempenhado um importante papel nas estratégias energéticas do presidente George W. Bush, e os investidores privados, incluindo Bill Gates, estão investindo quantias significativas no etanol, apostando em suas futuras promessas.
Na Flórida, o governador Jeb Bush aderiu à causa com propostas arrojadas que beneficiam o estado e toda a nação. O governador tem incentivado o governo federal a implantar uma iniciativa "15 by 15" (15 em 15), que estabeleceria a meta ambiciosa de consumo de 15 bilhões de galões anuais de etanol por volta de 2015. Para isso, o governador não somente conclama por um aumento no fornecimento doméstico, mas por políticas federais que abririam as portas das importações de nossos vizinhos do sul.
Os EUA poderiam aprender importantes lições do Brasil, que já conseguiu viabilizar a meta de auto-suficiência energética com o etanol desempenhando um papel vital. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em um editorial-opinião de 14 de julho no "The Wall Street Journal", comentou a independência energética do País, citando que a gasolina brasileira contém no mínimo 20% de etanol, que 40% do combustível consumido por carros é de etanol e quatro bilhões de galões de etanol são produzidos ao ano. É uma realização visionária notável.
Quando o presidente Bush visitou o Brasil, o etanol ocupou posição-chave nas discussões e uma porta foi aberta, podendo tornar-se uma parceria importante a beneficiar ambas as nações e outros países. Com a crescente demanda por etanol nos EUA e no resto do mundo, o mercado crescerá além da capacidade de produção de fazendeiros americanos e indústrias brasileiras, permitindo que outros países ocupem as lacunas. Colômbia, Guatemala e República Dominicana são alguns deles.
"Brasil e EUA terão muito a ganhar se pudermos trabalhar em conjunto para promover um mercado global de etanol, junto com os outros países envolvidos na sua produção…", afirmou o presidente Lula no "Journal", enfatizando a importância de uma parceria real para fomentar a produção de etanol em outros países: "Nos países pobres, a produção de etanol e biodiesel pode ter impacto extremamente positivo. Ela ajudará a lidarmos com o déficit de energia."
Para aderir à visão louvável de Lula, os EUA devem primeiro se guiar pelos exemplos. O governo federal deveria reexaminar a onerosa tarifa de 54 centavos por galão aplicada ao etanol brasileiro importado pelos EUA. Se isso ocorrer, a Flórida seria bastante beneficiada, pois nossos portos são os destinatários lógicos do etanol brasileiro.
Uma Iniciativa de Segurança Energética Hemisférica também reforçaria o valor de parcerias comerciais mais amplas, como a Área de Livre Comércio das Américas (Alca). A incerteza sobre a Rodada Doha fez o Brasil colocar as conversações da FTAA em "banho-maria". Mas o avanço em direção a uma parceria de etanol fortaleceria a confiança entre os países do hemisfério e promoveria um saudável ambiente de cooperação.
Nos últimos anos, acordos bilaterais e multilaterais de comércio entre os EUA e países latino-americanos têm conduzido a parcerias comerciais com cerca de dois terços do hemisfério. Em espírito, a FTAA está muito mais viva por meio dessas novas comunidades de comércio e suas metas ainda são apoiadas por alguns líderes no hemisfério.
Mesmo que os contenciosos comerciais consumam tempo e energia, a demanda cada vez maior por etanol em resposta às necessidades energéticas, realidades econômicas e segurança nacional deverão exigir que os líderes aproveitem a oportunidade para criar alianças críticas em torno dessa commodity.
Uma iniciativa de etanol uniria nossos interesses em uma parceria real, de uma forma nunca antes vista, que beneficiaria as próximas gerações, incentivaria parcerias hemisféricas e fortaleceria a segurança no futuro.