domingo, julho 23, 2006

LUÍS NASSIF À espera de 2006

FOLHA


A queda da Selic dará folga ao governo para compensar desatinos, mas o problema é a má qualidade dos gastos

SEJA QUEM for o próximo presidente, o próximo ano poderá ser decisivo para o início do processo de crescimento brasileiro. A avaliação otimista é compartilhada por alguns estrategistas de bancos estrangeiros.
Um dos pontos é que, mesmo com a cabeça dura do Banco Central, os juros irão cair inexoravelmente. O máximo que o BC pode fazer é adiar por algum tempo o processo.
Essa certeza decorre da arbitragem entre o custo de captação do Brasil no exterior e as taxas internas de juros. Hoje, o custo Brasil está por volta de 7,5%, quando historicamente ficava em 13,5%. A Selic pode cair tranqüilamente para 10%, sem ficar abaixo da taxa de equilíbrio.
Nas próximas semanas, o risco Brasil deverá cair ainda mais, em função de medidas a serem anunciadas pelo Tesouro -possivelmente a recompra do restante da dívida externa brasileira.
Se o Copom não baixar a Selic na mesma proporção da queda do risco Brasil, o ajuste virá via taxa de câmbio. Mais dólares entrarão no país, obrigando o BC a aumentar desmedidamente as reservas cambiais para conter uma apreciação maior do real. Portanto, além de não haver motivo para não acelerar a queda dos juros, a demora em derrubar os juros trará efeitos negativos sobre as reservas, com impacto na área fiscal.
Se as taxas caírem para 10%, não haverá maiores dificuldades para derrubar a dívida pública em até 3 pontos percentuais do PIB ao ano.
Quais os riscos? Este ano houve aumento imprudente nas contas públicas, não devido aos gastos sociais, mas a aumentos continuados aos servidores públicos. Houve dois gatilhos que dispararam esse processo. O primeiro, o enfraquecimento do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci. O segundo, a sensação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de que tinha sido ludibriado por Palocci em suas avaliações sobre gastos públicos. Segundo alta fonte do governo, um dos estratagemas de Palocci consistia em alocar recursos nos ministérios em programas de difícil implementação. Nas reuniões ministeriais, quando os ministros se queixavam da falta de verbas, ele acabava mostrando que havia recursos sobrando nos seus ministérios.
Quando se deu conta de que havia sido ludibriado, Lula passou a pressionar por mais gastos. E aí, o Ministro do Planejamento Paulo Bernardo -um super-ortodoxo, quando sob o guarda-chuva de Palocci- cedeu em vários momentos.
O aumento dos gastos não compromete o equilíbrio macroeconômico. A redução da Selic dará folga ao governo até para compensar os desatinos de 2005. O problema maior é a má qualidade dos gastos.
Para o próximo ano haverá necessidade de planejamento da aplicação das sobras decorrentes da queda dos juros, preferencialmente na redução da dívida e no aumento dos investimentos públicos. Para o próximo ano, estão em marcha preparativos em várias frentes para realocação da poupança a ativos de risco. Vários fundos de "private equity" estão sendo criados, há demanda por ativos imobiliários. O desafio consiste em acelerar providências institucionais de preparação do terreno para investimentos.


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