Folha de S. Paulo
1/7/2006
Cada vez que abasteço o carro aqui na Alemanha, penso baixinho: "Cadê
o escravo que vai sujar as mãos com a bomba de combustível?" (no
caso, diesel).
Não existe. É bandejão do combustível. Você vai lá, enche o tanque,
entra na casinha onde está o caixa, dá o número da bomba que usou,
paga e vai embora. Limpar vidros, olhar o óleo, calibrar pneus?
Problema seu.
Como bom pequeno-burguês, estranho o trabalho que me dão. Mas, de
repente, cai uma pergunta: na hora em que automatizarem os postos de
combustível no Brasil, já imaginou o aumento do desemprego decorrente
da dispensa de milhares de frentistas?
Que a automação virá, parece-me inevitável (não só nos postos). A
economia moderna faz do ser humano o elemento descartável, muito mais
que as máquinas, softwares, os pontos-de-venda etc.
A única coisa que pode retardar o processo (ou, no limite, até
inviabilizá-lo) é a confiança no outro. Aqui, se eu quisesse sair com
o carro sem pagar a conta, sairia. Não há nenhum obstáculo físico
entre a bomba e a saída. No Brasil, bom, é melhor deixar pra lá.
Na Venezuela, anos 70, quando o primeiro choque do petróleo fazia o
país nadar em dinheiro, o governo Carlos Andrés Pérez decretou que
teria que haver ascensorista até em elevador automático. Nem Hugo
Chávez, tido como o protótipo do populista radical, ousaria hoje
pensar em algo semelhante.
Mesmo porque não adiantou. A lógica econômica (e/ou a modernidade) se
impõe, mais cedo que tarde, avassaladoramente.
Na Alemanha, nem chega a ser um problemaço, dado o nível elevado de
proteção social (mesmo assim, o desemprego é muito alto, sempre nas
imediações de 10% da força de trabalho). O Brasil agüenta modernidade?