É conquista civilizatória sair do assistencialismo e do clientelismo para as políticas públicas normatizadas
PREMIADO na semana passada como o mais eficaz programa social da América Latina, o Programa Bolsa-Família tem um histórico interessante. Depois de um início tumultuado, na gestão Patrus Ananias o Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome incorporou duas ferramentas inéditas para políticas sociais brasileiras. A primeira, a adoção de princípio de "focalização", para melhor avaliar a eficácia das políticas sociais; a segunda -por sugestão da coluna-, um entrosamento com o MBC (Movimento Brasil Competitivo), que bancou um programa de qualidade para melhoria dos processos internos.
Trata-se uma conquista civilizatória para o país, sair do assistencialismo e do clientelismo para o campo das políticas públicas normatizadas. É um processo que tem os primeiros ensaios com o programa do leite do governo Sarney e o grande salto com a Constituinte de 1988, que consolida a assistência social no campo das políticas públicas. No início dos anos 90, no governo Collor, são promulgados o Estatuto da Criança e do Adolescente e a Loas (Lei Orgânica de Assistência Social). No governo Fernando Henrique Cardoso, ampliam-se as parcerias com empresas e ONGs. Agora, dá-se o salto institucional, com a unificação dos cadastros e o uso de ferramentas modernas de estatística e de gestão.
O modelo adotado foi o mesmo do SUS (Sistema Único de Saúde), com os municípios sendo divididos entre os de gestão plena (que administram os recursos que recebem), de semiplena e o não-habilitado. Essa estrutura é controlada por três níveis de conselhos, o municipal, o estadual e o federal. A rede chama-se Suas (Sistema Único de Assistência Social).
O pessoal da qualidade ajudou no gerenciamento de rotina, visando reduzir em 50% o tempo médio para repasses -que chegava a três meses. A segunda frente a ser atacada foi a área de monitoramento e avaliação, com a assessoria de uma equipe do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), liderada por Ricardo Paes de Barros.
No caso da avaliação, foram encomendados 61 estudos, já realizados ou em realização. A partir deles, cada programa é precedido de uma discussão, um termo de referência, reuniões para as definições mais importantes, pesquisa e acompanhamento e resultado final.
Pelos estudos iniciais, encomendados ao IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o Bolsa-Família aumentou em 21,35% o orçamento médio familiar, que passou de R$ 302 para R$ 365. Há evidências de que aumentou a freqüência das crianças nas escolas. No decil mais pobre da população, 93% das crianças estão na escola. Entre as famílias do Bolsa-Família, são 98%. Uma outra medida foi o déficit de tamanho (melhor que o déficit de peso para medir subnutrição). Entre crianças de 6 a 11 meses, o déficit é de 6,8% para não-inscritos no programa e de 4,8% para os inscritos.
Não se irá conseguir o objetivo final do programa -a emancipação por meio do emprego- enquanto persistir essa política econômica absurda. Mas é mais uma frente pronta para o bom combate, quando o jogo do desenvolvimento começar para valer.