sábado, maio 27, 2006

Cresce o poder de compra dos mais pobres


VEJA
Votando com a barriga

Além do Bolsa Família e do salário, Lula
ganha o voto do pobre com comida barata


Julia Duailibi



As pesquisas voltaram a mandar boas notícias ao presidente Lula. Em dois levantamentos distintos feitos na semana passada, um do instituto Datafolha e outro do Sensus, o presidente aparece com mais votos do que a soma dos adversários, o que lhe daria vitória já no primeiro turno da eleição. Conforme os números do Datafolha, Lula conseguiu voltar ao seu melhor índice de popularidade já registrado neste ano . Com isso, Lula repetiu o desempenho que tinha antes da devastadora denúncia do procurador-geral da República contra a "organização criminosa" do bando dos 40. A pergunta que tem intrigado a oposição é a seguinte: o que mantém a popularidade de um presidente em cuja vizinhança apareceu tanta podridão? As pesquisas já mostraram que o Bolsa Família, que distribui até 95 reais às famílias pobres, é um dos responsáveis pela popularidade de Lula. Agora, começa a ficar evidente que, além do Bolsa Família, o presidente conta com um binômio eleitoralmente poderoso: a queda dos preços dos alimentos associada ao aumento do poder de compra do salário mínimo.

Nos três primeiros anos do governo petista, a inflação acumulada chegou a quase 25%, mas os alimentos subiram apenas 9% – o que tem uma repercussão notável no orçamento de famílias menos abastadas. Só o preço do arroz, produto onipresente na dieta dos brasileiros, caiu um terço de 2003 para cá. A tendência prossegue inalterada. Nos quatro primeiros meses deste ano, o preço do arroz baixou 5,2%, além de produtos mais nobres, como a carne, cujo quilo ficou 6% mais barato (veja quadro ao lado). A parcela mais pobre do eleitorado tem manifestado sua satisfação na forma de voto. De acordo com a pesquisa do Datafolha da semana passada, Lula tem 27% de preferência nas famílias cuja renda mensal é superior a dez salários mínimos. Mas, nas famílias que ganham até dois mínimos, Lula salta para 49%. "A vida melhorou muito", diz a faxineira Luana Maria, 22 anos, bebê no colo, moradora de uma área pobre a 10 quilômetros do Palácio do Planalto. "Antes, o litro do óleo custava 3,40 reais. Hoje, encontro até por 1,15", diz ela, que ganha 347 reais. Luana Maria informa que votará em Lula.

As pesquisas mostram que o eleitorado brasileiro em geral, e não apenas sua parcela mais pauperizada, coloca como uma das prioridades ter acesso a alimentação farta, variada e barata. Em sucessivas pesquisas do instituto Sensus, feitas de 2004 para cá, os eleitores mostram que prestam muita atenção ao preço dos alimentos – e deixam claro que, depois da "reforma na casa", a primeira coisa que fariam com um eventual aumento de salário seria "melhorar a alimentação". Na última pesquisa da série, realizada em dezembro passado, constata-se que o temor de que os alimentos aumentem de preço caiu de 31% para 20%. "Com o preço dos alimentos subindo abaixo da inflação média, o poder de compra do salário mínimo se fortalece", diz o economista André Braz, da Fundação Getulio Vargas. O poder de compra do salário mínimo, porém, não acresceu apenas em função do baixo preço dos alimentos. Nos três primeiros anos do governo atual, teve um aumento real da ordem de 25%. Com o salário mínimo de hoje, pode-se comprar muito mais comida do que há cinco ou dez anos 

Obviamente, o presidente Lula não se interessa em ressaltar em seus discursos que o bom desempenho do preço dos alimentos não é resultado de políticas específicas de seu governo, mas da estabilidade monetária, cujas bases foram plantadas por seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso. Em 2004, Lula eliminou a incidência de dois tributos, o PIS e a Cofins, sobre uma série de produtos alimentícios de consumo popular, numa tentativa de favorecer a mesa dos brasileiros mais pobres, mas os economistas são unânimes em dizer que o efeito sobre o preço final da cesta básica foi praticamente nulo. Fatores pontuais têm contribuído também para a queda do preço dos alimentos. O preço do arroz, por exemplo, tem caído devido à superprodução e à concorrência com o produto mais barato importado da Argentina e do Uruguai. O dado que melhor explica a queda nos preços dos alimentos, no entanto, é a valorização do real diante do dólar, que desestimula a exportação e provoca aumento da oferta de alimentos no mercado interno. Na vigência do Plano Real, Fernando Henrique ganhou popularidade com a queda nos preços do frango e do iogurte. Reelegeu-se, mas não fez o sucessor. Agora, Lula fatura com alimentos baratos.





Fotos Wilton Junior/AE e Pedro Rubens