domingo, abril 30, 2006

LUÍS NASSIF Adolf Berle Jr. e a diplomacia do dólar

FOLHA

Os EUA passaram a se tornar a grande potência mundial quando substituíram a diplomacia das canhoneiras pela do dólar, a política infame de colonização da França e da Inglaterra pré-Segunda Guerra pela de estimuladores do desenvolvimento de seus vizinhos.
Nem sempre a política teve continuidade. Mas, neste momento de abusos de empresas brasileiras em países vizinhos, talvez valesse a pena inspirar-se na ação de Adolf Berle Jr., embaixador americano no Brasil no período Vargas-Dutra.
Em 1937, o então presidente norte-americano, Franklin Delano Roosevelt, foi convencido de que o melhor caminho para o fortalecimento dos Estados Unidos seria contribuir para o desenvolvimento do continente, provendo recursos sem procurar interferir nas políticas locais.
Dois grupos participam dessas formulações. Um deles composto pelo subsecretário de Estado, o influente Sumner Welles, o diretor da União Pan-Americana Leo Rowe e o secretário-assistente Adolf Berle. O outro, por grandes empresários, liderados por Nelson Rockefeller, e pelo cientista social Beardsley Ruml. Berle foi escolhido para comandar a operação latino-americana, e sua indicação tinha um significado especial: ele ajudara enormemente a obter a cooperação dos empresários para o New Deal.
Figura singular, Berle era filho de um ministro e missionário leigo que trabalhou com os sioux. Tinha a idéia fixa de que as reformas de que os EUA precisavam dependiam da regeneração dos empresários, de seu compromisso com as reformas sociais.
No dia 28 de junho de 1937, Roosevelt transformou as idéias em programa de governo, o Pan-Americanismo, que, conforme a definição do cientista político Gerson Moura, iria se basear em "uma realidade fundada nos ideais comuns de organização republicana, na aceitação da democracia como um ideal, na defesa da liberdade e da dignidade do indivíduo, na crença na solução pacífica da disputa e na adesão aos princípios de soberania nacional".
O que interessa, no caso, é o papel fundamental de Berle na construção do parque brasileiro de refinarias. Berle sabia que o crescimento brasileiro sustentado dependia de uma solução para a questão dos combustíveis. Tinha vivos, na memória, os desastres ocorridos no México, na Venezuela e na Bolívia, devido a concessões quase monopolistas à indústria de petróleo americana.
O primeiro presidente do Conselho Nacional do Petróleo, general Horta Barbosa, defendia um parque de refino com capital privado nacional. Seu sucessor, coronel João Carlos Barreto, mudou o rumo da política e chegou a ser cínico, quando o advogado João Pedro Gouvêa Vieira foi denunciar que estava sendo alvo de uma proposta da Gulf Oil de se tornar seu testa-de-ferro por US$ 5 milhões:
"Isso apenas prova que você é honesto até o limite de US$ 5 milhões", conforme o próprio João Pedro me contou cerca de 14 anos atrás.
A Standard Oil fez pressão sobre o governo americano para que atuasse para reverter a política brasileira. Depois de ter registrado lucros gigantescos no Brasil, manifestava seu "receio" de que, refinando petróleo com capital nacional, o Brasil acabasse pagando um preço muito alto pelo produto. "Sua preocupação de que o Brasil pague um preço alto demais -a brasileiros- para refinar petróleo, no Brasil, parece-me simplesmente engraçada", comentou Berle, conforme registrou o historiador Stanley Hilton no livro "O Embaixador e o Presidente".
Em meados de 1945, Berle sugeriu ao Departamento do Estado a criação de uma comissão bilateral, Brasil-EUA, incumbida de vigiar as atividades de companhias estrangeiras, a fim de assegurar que, nas palavras dele, "o povo [brasileiro] receba os benefícios dos recursos". Com essa visão, apoiou o projeto do CNP de estabelecer refinarias, com capital nacional.
Acabou passando para a história como conspirador, após um controvertido discurso proferido em 29 de setembro de 1945, no Sindicato dos Jornalistas, quando defendeu claramente as eleições presidenciais marcadas para dezembro, criticou os conspiradores udenistas e advertiu os queremistas e os partidários do movimento Constituinte-com-Getúlio.


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