segunda-feira, março 27, 2006

Tão podre, tão cedo

Tão podre, tão cedo
Artigo - Vinícios Torres Freire
Folha de S. Paulo
27/3/2006

Aos 21 anos de democracia, quase 18 de Constituição, as instituições parecem incapazes de reforma, de si mesmas e do país. Chegamos, enfim, ao clichê tantas vezes proclamado por ninharias, mas agora de cogitação razoável, da crise institucional? Pode ser, mas convém evitar farisaísmos e udenismos como atribuir a crise a corrupções apenas.
Há menos de 20 anos o país nem sabia o quanto e como gastava, pois as contas públicas eram uma confusão permissiva e aberta à rapinagem bilionária. Há 12 anos a hiperinflação dissolvia a economia e a bolsa dos mais pobres. O país fechado favorecia a corrupção no comércio exterior e a exploração do consumidor.
A dimensão de tais desvios e saques, ora esquecida, era incomparavelmente maior que a corrupção conhecida ou suspeitada hoje em dia.
O que hoje parece mais sério é a conjunção da paralisia dos movimentos sociais com a captura das instituições pelo interesse menor de estamentos e classes. Como catalisadores da deterioração, há o renitente reacionarismo socioeconômico e a dissolução do conflito social em crime.
O Banco Central, nem autônomo nem sujeito ao controle democrático, foi capturado de maneira descarada pelo interesse da banca. Ao menos metade do Congresso está à venda ou aceita tal comércio. Juízes supremos fazem da toga trampolim político; o juizado estadual considera o Judiciário patrimônio familiar.
O partido popular, o PT, foi dominado pelo sindicalismo de rapina; os sindicatos são pelegos. O lulismo patrocina conspirações de Estado policial. A oposição, o PSDB, não prestou contas da ruína fiscal que promoveu para manter-se no poder e fazer privatizações porcas. Fundos sociais são capturados pela classe média e alta.
Gestão da moeda e da economia, representação popular e justiça estão à beira de colapsos, apesar de reformas pontuais, remendos.
A Constituição está puída. A reforma essencial, a da miséria, está bloqueada por instituições que nem dão conta de colocar o país no andamento liberal, da rotina democrática.