quarta-feira, março 01, 2006

CELSO MING O PIB intangível

OESP

O avanço do PIB no ano passado, de apenas 2,3%, foi a decepção já conhecida e isso reacende as discussões sobre até que ponto esses cálculos refletem o que de fato acontece com a economia.

O ex-presidente do Banco Central Francisco Lopes, que já vinha criticando a metodologia empregada pelo IBGE, passou a alertar para equívocos nos cálculos do ajuste sazonal. E o próprio IBGE já reconheceu que são necessárias correções que passarão a ser incorporadas em meados deste ano.

Mas esta não é uma discussão apenas tupiniquim. No mundo inteiro, as novas tecnologias e as transformações da economia estão multiplicando os chamados "intangíveis" e lançam dúvidas sobre os números oficiais, especialmente sobre a verdadeira magnitude do investimento (Formação Bruta de Capital Fixo). É Pesquisa e Desenvolvimento, projetos de inovação, treinamento profissional, transferência de conhecimento e tanta coisa que muda tudo na economia e, no entanto, não entra nas contas nacionais.

Outras dificuldades eram velhas de guerra. O professor André Franco Montoro Filho, da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade (FEA) da USP, lembra a questão ambiental. O desmatamento, por exemplo, é contabilizado como aumento da produção (de madeira, de móveis e de formas para construção civil). Mas essa conta não reflete a destruição da floresta e o impacto que terá no futuro.

Toda empresa possui certa quantidade de ativos financeiros e certo acervo em conhecimento e informações. Mas, na hora de se calcular o PIB, são considerados apenas os ativos físicos, e não o conhecimento que alavanca o desenvolvimento da empresa. Daí provêm inúmeras distorções. "A avaliação econômica precisa ser mais qualitativa e não só quantitativa", observa Antônio Corrêa de Lacerda, da PUC de São Paulo.

Um exemplo dessa imprecisão é a contabilização da educação como consumo e não como investimento. "Hoje um dos fatores mais importantes para o crescimento econômico de um país, mais até do que o capital físico, são os recursos humanos", observa Montoro. No entanto, apesar da evolução da "sociedade do conhecimento" - na qual dados e informações têm valor cada vez mais alto -, não há consenso sobre o que se pode ou não considerar investimento.

Para qualquer atividade, observa o professor Paulo Sandroni, da Fundação Getúlio Vargas (FGV), esses são valores determinantes, mas não há como medi-los. "Uma empresa que não usa o trabalho infantil tem um valor substancialmente maior do que aquela que usa. Como medir essa diferença?"

O professor Lacerda ressalta que os países em desenvolvimento têm outro desafio: o cálculo da economia informal.

A edição do dia 6 de fevereiro da revista BusinessWeek comentou o debate lançado por Carol Corrado e Daniel Sichel, economistas do Federal Reserve (o banco central dos Estados Unidos), e Charles Hulten, da Universidade de Maryland, que questionam a forma como é medida a produção. E concluem não só que a riqueza dos Estados Unidos é substancialmente maior do que a avaliada hoje, mas também que a sociedade americana, considerada tão perdulária, poupa muito mais do que mostram os números. Esses economistas não chegam a apontar o tamanho das correções a serem feitas.

Mas são análises que ajudam a explicar por que os macroproblemas da economia americana ainda não provocaram uma brutal desvalorização do dólar. Se, por exemplo, o PIB americano é bem maior do que o apontado nas estatísticas, então cada um dos déficits é também menor em relação ao PIB real.

COLABOROU DANIELLE CHAVES