quarta-feira, fevereiro 22, 2006

Editorial da Folha de S Paulo A TÁTICA DO DESPISTE

O aumento maior do salário mínimo, a operação tapa-buracos nas estradas, o subsídio à contratação de empregados domésticos, a corrida para espalhar "farmácias populares". A máquina reeleitoral do presidente da República funciona a pleno vapor. Sua estratégia reúne a receita usual dos políticos em sua condição -acumular a toque de caixa "realizações" para exibir na campanha- e a tática do despiste.
Esta consiste em erigir entre o eleitorado e a recentíssima história política um anteparo repleto de slogans, cifras e comparações com o passado escolhidas a dedo. O objetivo é desviar os olhares dos descalabros éticos praticados na esfera federal a favor do consórcio de poder do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O governismo se vale da fadiga de parcela da opinião pública com as notícias do escândalo de corrupção. Também se aproveita do momento em que o PSDB trava uma disputa interna para decidir seu candidato à Presidência.
Mas esse cenário em que o núcleo em torno de Lula exibe sua versão edulcorada da gestão sem ser contrastado não vai persistir. O aproximar da campanha vai trazer uma carga decerto inédita de questionamentos do governo Lula no aspecto da moralidade pública.
Sob a gestão petista revelou-se a existência de um esquema de pagamento em dinheiro vivo a parlamentares governistas organizado pelo PT; o publicitário responsável pelas campanhas da legenda em 2002 -inclusive a de Lula- admitiu ter sido remunerado com dinheiro ilegal. Como se não bastasse, houve a anedótica prisão de um assessor petista que tentava embarcar em um vôo com US$ 100 mil na cueca.
Em conseqüência do escândalo, o ministro tido como o mais forte do governo foi obrigado a deixar seu posto e teve o mandato parlamentar cassado; o presidente, o secretário-geral e o tesoureiro do PT caíram por ligações com o esquema criminoso; na fila das cassações está, entre outros, o deputado petista que, na condição de presidente da Câmara, sacou R$ 50 mil do "valerioduto".
Por mais que a propaganda governista tente evitar, o eleitor será instado a refletir sobre esses fatos antes de decidir em quem votar para presidente. E é bom para o amadurecimento democrático que assim seja.