JB
Nas cadeias do Brasil, delinqüentes com notável milhagem criminosa e alguma escolaridade acabam conhecendo intimamente os mesmos códigos que vivem atropelando. Com ares de advogado, orientam parceiros de presídio enredados em processos jurídicos. Com a mesma naturalidade exibida na hora de agredi-la, usam a lei para levar vantagem. São os rábulas das gaiolas.
Uma ramificação da espécie parece ter sido identificada nos domínios do PT. É o que sugere a tática escolhida por Ricardo Berzoini, presidente do partido, para a guerra contra tucanos muito agressivos. O chefe da tribo ofendeu-se especialmente com uma frase do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (''A ética do PT é roubar''), endossada pelo senador Tasso Jereissati. E resolveu enquadrar os dois nos artigos que tratam dos crimes contra a honra.
''Se me processarem, vou pedir a exceção da verdade'', retrucou FH. (Exceção da verdade é uma figura jurídica que permite ao acusado provar o que disse e, assim, livrar-se de eventuais punições). FH e Tasso poderiam valer-se dessa arma se fossem acusados de ter caluniado o PT. Segundo o artigo 138 do Código Penal, comete calúnia quem imputa falsamente a alguém fato definido como crime. Ou, ''sabendo falsa a imputação, a propala ou divulga''. Isso dá cadeia e multa. Mas permite a exceção da verdade.
Esperto, Berzoini saltou para o artigo seguinte e acionou FH por difamação. É bem mais leve a pena prescrita para quem ''difamar alguém, imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação''. Mais importante ainda, o parágrafo único do artigo 139 estabelece que ''a exceção da verdade somente se admite se o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções''.
De nada adiantaria aos acusados, por exemplo, a exposição das patifarias protagonizadas por Silvinho ''Land Rover'' Pereira ou Delúbio ''Jatinho'' Soares. São duas provas ambulantes de que, para muitos dirigentes do PT, roubar é ético. Mas nem Delúbio nem Silvinho são funcionários públicos.
Berzoini anda cada vez mais sabido.
Mudança patética
A falta de carisma custou ao governador Geraldo Alckmin o apelido de ''Picolé de Chuchu''. A idéia de transformar a chacota em arma eleitoral comprova que também lhe falta a veia histriônica.
Com o jeitão bem-comportado de genro-com-que-sonha-toda-mãe-de-virgem, Alckmin foi prefeito de Pindamonhangaba, deputado federal, líder da bancada majoritária na Câmara, vice de Mário Covas e governador eleito. De repente, mudou o figurino.
E também o discurso. ''O Brasil vai crescer pra chuchu'' é uma tolice. ''Meu governo vai ser um chuchuzinho'' é uma frase bisonha. Achar que o eleitorado ainda exige candidatos carismáticos é um grave erro de avaliação. Com efeitos letais.
Coisa de Maluf
Ex-procurador-geral de Justiça de São Paulo, Luiz Antônio Marrey é um homem da lei acima de qualquer suspeita. No momento incorporado à força-tarefa que tenta repatriar os dólares desviados por Paulo Maluf para contas no exterior, Marrey garante que, ao menos neste episódio, tem sido exemplar o comportamento do Ministério da Justiça e, especificamente, do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI)
A fortuna camuflada em paraísos fiscais continua por lá graças ao repertório de truques jurídicos invocados por advogados do doutor Paulo. Como ensinou Duda Mendonça, também neste caso os trambiques devem ser debitados ao homem que tudo fez, faz e, se a polícia deixar, sempre fará.
[23/FEV/2006]