| Coluna - Coisas da política |
| Jornal do Brasil |
| 24/1/2006 |
Na estampa e nos modos, o advogado paranaense Osmar Serraglio parece um político acidental. Aos 57 anos, casado, pai de uma filha, lembra um avô de antigamente. A voz mansa não denuncia alguém disposto a brigar com vizinhos inconvenientes. Os gestos vagarosos e o apreço por minúcias o assemelham a um funcionário de cartório. Limitara-se a reivindicações que favorecessem a região que representa. Aparentemente, o cotidiano obscuro não lhe causava desconforto. Foi então que relâmpagos e trovões anunciaram a grande tempestade. E o destino bateu à porta de Osmar Serraglio. Inquietos com o mau tempo, estrategistas do Planalto imploraram aos parceiros do PMDB que escolhessem com especial cautela o relator da CPI dos Correios, cargo reservado ao partido por circunstâncias regimentais. O líder da bancada, José Borba, lembrou-se do colega paranaense. Serraglio sempre ajudara a aprovar projetos considerados relevantes pelo governo. Mantinha relações amistosas com o chefe da Casa Civil, José Dirceu. Decerto saberia ajudar os amigos surpreendidos pelo pior dos temporais. Oito meses depois, está claro que os generais governistas não conheciam aquele soldado raso. Não sabiam que Osmar Serraglio é um homem de bem. Não pressentiram que os princípios éticos do advogado tinham consistência para neutralizar constrangimentos impostos ao deputado. José Dirceu sucumbiu à guilhotina. Borba renunciou ao mandato para evitar a morte política. O governo e seus aliados descobririam tarde demais o tamanho do equívoco. A entrevista publicada pela revista Veja apresentou ao país um guerreiro incansável, especializado na localização de casamatas e trincheiras atulhadas de corruptos. Desde junho concentrado nos trabalhos da CPI, Serraglio acumulou evidências e provas suficientes para implodir a falácia destinada a confinar a imensa roubalheira no mundo do caixa 2. Comprovou-se de forma irrefutável que o mensalão existiu e alcançou altitudes ainda mais delirantes que as imaginadas no começo da crise. O relatório final do deputado promete figurar na estante dos documentos que honram o Brasil decente. Tornará inevitável o indiciamento dos envolvidos em pilantragens medonhas. Nem Lula ficará fora dessa. O relatório avisa que o presidente soube há tempos das patifarias urdidas pelo círculo íntimo de assessores e pela cúpula do partido. Na mais branda das hipóteses, o presidente terá pecado por negligência. A conclusão convida à formalização do pedido de impeachment. Serraglio se mostra sinceramente perplexo com quem insiste, como o presidente, que ainda não foi provada a montagem do esquema de corrupção. Admite que a CPI poderia ter avançado muito mais se o governo estivesse efetivamente interessado na busca da verdade. Mas o Planalto se esforçou todo o tempo em proteger alvos de alta periculosidade. No momento, o serviço de socorro a pelintras tenta evitar o fuzilamento de Duda Mendonça. Serraglio está convencido de que Marcos Valério foi um apêndice no esquema chefiado por Duda. O relatório trata detalhadamente dessas maracutaias. E escancara sem medo dezenas de tenebrosas transações. É a leitura do ano. |