sexta-feira, dezembro 23, 2005

LUIZ GARCIA Depressa como Edmundo

O GLOBO

Como definir as relações entre Edmundo Alves de Souza e os deveres da cidadania? Aparentemente, são distantes — e, da parte dele, pouco cerimoniosas.

Parece óbvio que, se alimentasse algum respeito pelo direito à vida alheia, esse cavalheiro não teria o hábito de dirigir embriagado madrugadas adentro. Principalmente depois de ter provocado três mortes numa louca correria, em julho de 1995.

Na madrugada de segunda-feira passada, sua correria ao volante não fez vítimas: policiais o prenderam a tempo. E a imprudência criminosa desse bom jogador de futebol saiu-lhe barata: uma autuação por embriaguez ao volante e desacato à autoridade. Custo total: multa de R$ 3 mil, mais um processo que menos avança do que se arrasta. A legislação a respeito não é especialmente severa com a reincidência em alguns comportamentos anti-sociais.

Pode estar parecendo até aqui, mas este artigo não é contra Edmundo. Ele é o que é, sabe-se lá por que motivos; pode ser famoso, mas não passa de mais um entre muitos bêbados ao volante que a todo momento matam ou quase matam pessoas inocentes. E têm fartos recursos para brigar nos tribunais.

Por isso mesmo, talvez importe menos denunciar cada um dos edmundos ao volante do que lamentar a lentidão com que está sendo aperfeiçoado e agilizado o sistema que deveria nos proteger deles. A reforma do sistema judiciário brasileiro tem feito avanços recentes, alguns notáveis. Mas o caminho pela frente ainda é longo e acidentado. E não tem a rapidez com que voava Edmundo, em dezembro de 1995, madrugada alta, na Lagoa Rodrigo de Freitas. A corrida terminou quando o jipão Cherokee dirigido por ele praticamente esmagou um Fiat. Morreram uma moça de 16 anos, outra de 20, um rapaz de 23. Outras cinco pessoas foram feridas.

O jogador escapou ileso e ileso continua. Quatro anos depois — num processo até rápido pelos padrões nacionais — foi condenado por homicídio culposo e lesões corporais. Mas foi só a primeira instância. Ele continua com plena liberdade de ir depressa e vir voando. O processo criminal está no Superior Tribunal de Justiça, e ainda pode bater — sem duplo sentido — no Supremo Tribunal Federal. A demora já deu tempo a Edmundo para mais uma colisão (essa sem vítimas) em julho passado, antes do incidente do outro dia.

É justo registrar que, desde o primeiro acidente, as leis ficaram alguma coisa mais severas; por exemplo, sua carteira poderia estar hoje apreendida. Não é grande coisa e principalmente não ameniza o absurdo de estar tão longe do fim o processo criminal.

Ninguém ignora os esforços que vêm sendo feitos para modernizar o sistema judiciário. É trabalho meritório. Lento, mas aos poucos avança. Quem dera que andasse tão depressa quanto os edmundos que nos esperam todas as noites, em todas as ruas.