sábado, dezembro 24, 2005

Editorial de O Estado de S Paulo

Os perigos da pressa

O governo acaba de reduzir para zero a alíquota do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de 14 máquinas e produtos de tecnologia e anuncia, para os próximos dias, novos cortes de impostos, que vigorarão em 2006. Dados o altíssimo peso dos tributos sobre a economia, que tolhe o crescimento, e o aumento contínuo da arrecadação, como acaba de informar a Secretaria da Receita Federal, medidas de redução de impostos são sempre bem-vindas. A súbita hiperatividade do governo nesse campo, porém, indica menos preocupação com a aflitiva situação dos contribuintes do que com a situação política e eleitoral do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de seu partido, o PT.

Não parece ter sido por simples coincidência que essa inesperada atenção do governo com a excessiva tributação da atividade produtiva tenha surgido imediatamente após a divulgação das pesquisas de opinião pública em que a avaliação do governo e do presidente da República foi a pior que já tiveram, seguidas das pesquisas de intenções de votos que mostravam a derrota de Lula já no 1º turno. A reforçar a suspeita de motivação meramente político-eleitoral das novas bondades tributárias está o fato de que, ao mesmo tempo que procura reduzir impostos, o governo trata de acelerar os gastos nos últimos dias de 2005 com o objetivo de agradar a aliados e eleitores.

São atitudes que revelam comportamento de um governo assustado com os maus resultados da economia e, sobretudo, com a possibilidade - agora já uma probabilidade - de ser derrotado nas urnas em 2006. Um governo assustado, que age por impulsos, pode até acertar, mas corre sério risco de errar.

Não há dúvida de que a redução da alíquota do IPI da média de 5% para zero para bens de capital como tratores agrícolas, máquinas para trabalhar couro e peles, máquinas para metalurgia, aciaria e fundição, e partes de turbinas a vapor, bombas e fornos industriais ou de laboratórios, bem como do tributo incidente sobre equipamento emissor de nota fiscal, entre outros, é boa para a economia. Ela complementa o corte de impostos propiciado pela chamada "MP do Bem", que deve resultar numa renúncia fiscal calculada em R$ 5,7 bilhões.

Se se levar em conta o contínuo crescimento da arrecadação, a medida é perfeitamente justificável. Em novembro, a arrecadação de tributos federais totalizou R$ 29,835 bilhões, resultado recorde para os meses de novembro. Nos 11 primeiros meses de 2005, a arrecadação chegou a R$ 327,14 bilhões, com aumento real de 5,47% sobre o resultado de igual período de 2004. Números como esses evidenciam que ainda há muito espaço para o corte de impostos, especialmente do IPI, cuja arrecadação vem crescendo, neste ano, mais depressa do que o total dos tributos arrecadados .

Apesar dos fatores que recomendam a redução de impostos, é necessário observar que a decisão anunciada na semana passada não parece ter sido baseada em profundos estudos técnicos como costumam ser as medidas de desoneração tributária. Tanto que, ao contrário do que ocorreu com benefícios anteriormente concedidos pelo governo, desta vez a Receita não apresentou uma estimativa de perda de arrecadação. Não terá impacto muito forte em termos de renúncia fiscal, limitou-se a dizer o secretário-adjunto da Receita.

Além da redução de impostos, o presidente Lula parece disposto a tomar outras medidas que estimulem a atividade econômica. E pretende fazer isso por meio de uma corrida de gastos nos últimos dias do ano. A idéia é forçar os ministérios a fazerem o empenho, medida administrativa por meio da qual a quantia prevista no orçamento para determinada atividade fica reservada e não mais poderá ser aplicada com outra finalidade. É uma espécie de garantia para o fornecedor ou prestador do serviço de que a parcela referente a seu contrato foi bloqueada para o pagamento devido. Um técnico do governo descreveu a situação como "a corrida do empenho".

É difícil imaginar que um governo que em três anos gastou muito mal, quando conseguiu gastar, os recursos previstos no orçamento, daqui para a frente passe a gastar bem, em benefício da população. Por isso, o que se teme é que essa corrida do empenho se transforme em corrida do desperdício.