segunda-feira, novembro 28, 2005

A hora das provas

BLOG Josias de Souza

A hora das provas

Lula anda dizendo pelos quatro cantos que as CPIs não provaram nada de nada. O mensalão, disse ele, já virou ate marchinha de Carnaval sem que tenha sido demonstrado. Pois o presidente terá de arrumar outro mote para seus discursos.

O relator da CPI dos Correios, Osmar Serraglio (PMDB-PR), afirmou ontem à FOLHA que apresentará novo relatório parcial sobre as investigações da comissão, entre os dias 10 e 15 de dezembro. Apontará no texto "as razões" da CPI para "ratificar" a existência do "mensalão". Segundo Serraglio, a CPI "já disse que tem o esquema do mensalão e vai confirmar".

Em entrevista à mesma FOLHA, o presidente da CPI do Fim do Mundo (Bingos), Efraim Moraes (PFL-PB), diz ter a confirmação de pagamento de propina na prorrogação do contrato de R$ 650 milhões da Caixa com a multinacional GTech.

Lula terá agora de escolher entre dois caminhos: pode refutar as acusações que as CPIs dizem ter comprovado ou pode continuar fingindo que nada é com ele. Se optar por esta última alternativa, os observadores mais atentos serão compelidos a concluir que, sob essa fachada meio nonsense do presidente se esconde um dissimulado completo.

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CPI ratificará "mensalão" em relatório SILVIO NAVARRO
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BRASÍLIA

O relator da CPI dos Correios, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), afirmou ontem que apresentará um novo relatório parcial sobre as investigações da comissão, entre os dias 10 e 15 de dezembro, no qual apontará "as razões" da CPI para "ratificar" a existência do chamado esquema do "mensalão".
"A CPI vai demonstrar quais as razões pelas quais entende que o "mensalão" está comprovado. Vai ratificar as razões pelas quais entendeu que há o "mensalão". Já disse que tem [o esquema] e vai confirmar", disse Serraglio.
Segundo o relator, a idéia não é apresentar novos nomes de supostos beneficiários do esquema nem aprofundar as investigações sobre eles, mas "interpretar o sistema". "A idéia é passar qual é a nossa concepção em relação ao "mensalão". Não em relação aos parlamentares, não queremos mais discutir saques, mas interpretar o sistema."
Inicialmente, a CPI dos Correios tinha sido encarregada de apurar a origem dos recursos que abasteceram o caixa dois do PT. A incumbência de confirmar ou não a existência dos repasses a parlamentares era da chamada CPI do Mensalão, que terminou há dez dias sem a votação de um parecer conclusivo.
Após o fiasco da CPI do Mensalão, o relator da comissão, deputado Ibrahim Abi-Ackel (PP-MG), admitiu o uso de recursos ilícitos para pagamentos de dívidas de campanha, mas não concluiu a existência do "mensalão" nos moldes denunciados pelo deputado cassado Roberto Jefferson (PTB-RJ), ou seja, o pagamento pelo PT de mesada de R$ 30 mil a deputados do PP e do PL em troca de apoio no Congresso.
"Vamos dizer muito claramente, verificar aquelas liberações tópicas em relação a determinadas votações ou o levantamento do [deputado] Júlio Redecker [PSDB-RS], dos "semanões", a cada semana R$ 500 mil. Essa tabulação não apareceu em lugar nenhum", afirmou Serraglio.
Integrante da CPI do Mensalão, Redecker apresentou um levantamento feito a partir da quebra de sigilo bancário da empresa Guaranhuns -supostamente utilizada como empresa de fachada no esquema para repassar recursos para o PL- ,que, segundo ele, mostra repasses da empresa que somavam R$ 500 mil por semana em 2003.
Para Serraglio, é possível atestar a ocorrência do "mensalão" a partir de dados já coletados pela CPI. Além disso, ele afirmou que seu relatório parcial irá pedir o indiciamento de diversas pessoas. Ele não citou os nomes, mas disse que são de pessoas ligadas a contratos com irregularidades.
A idéia de elaborar um novo relatório parcial decorre de duas razões: mostrar que a CPI já tem dados conclusivos sobre a maioria das frentes de apuração e acabar com disputas internas entre governo e oposição sobre o trabalho das sub-relatorias.
A espinha do novo texto de Serraglio passa por 12 tópicos (veja quadro nesta página), elencados pelo relator-adjunto da CPI, deputado Eduardo Paes (PSDB-RJ) no final de semana, após o que chamou de "pente-fino" nos papéis coletados pela comissão. Segundo Paes, a intenção é estabelecer um elo entre as diferentes frentes de apuração e "ajustar o foco do que já está muito perto de ser concluído".
Os principais pontos, segundo Paes, tratam de contratos de publicidade de estatais com as agências do publicitário Marcos Valério de Souza e de possíveis financiadores privados do esquema que abasteceu o caixa dois do PT.
"A idéia foi identificar os principais itens que têm elementos para bater o martelo, que já estão em fase avançada", disse Paes. "O foco está claro. Não dá para a CPI, a cada escândalo que surge, tratá-lo como prioridade."
A CPI já apresentou um relatório parcial em que pedia a abertura de processo contra 19 deputados por envolvimento no esquema. Um deles (Jefferson) já foi cassado; quatro renunciaram e um (Sandro Mabel, do PL-GO) foi absolvido. Os demais aguardam julgamento da Câmara.

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Houve propina no caso GTech, diz presidente da CPI dos Bingos

ANDRÉA MICHAEL
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O presidente da CPI dos Bingos, senador Efraim Moraes (PFL-PB), diz ter a confirmação de pagamento de propina na prorrogação do contrato de R$ 650 milhões da Caixa Econômica Federal com a multinacional GTech para a gestão dos sistema de loterias e nega que a comissão tenha extrapolado seu foco em busca de munição contra o governo.
Moraes citou como propina um pagamento de R$ 5 milhões feito pela GTech a Valter Santos Neto, da empresa MM Consultoria. A Folha telefonou ontem para Santos Neto, mas ele não atendeu aos telefones em sua casa.
Para Moraes, o governo está preocupado com a "verdade" buscada pela comissão. O governo promete recorrer ao Supremo Tribunal Federal para que a CPI se atenha ao setor de jogos.
"Não há isso, que a CPI está fugindo do foco. É uma CPI que o governo não desejava -tivemos que instalá-la com determinação do Supremo- e que depois, devido ao trabalho, à transparência e à independência, começou a preocupar o governo", disse Moraes, em entrevista ontem à Folha, por telefone.
"Temos informações da máfia dos jogos envolvida tanto em Santo André como em Campinas e Ribeirão [Preto]", afirmou, para justificar o motivo de a comissão apurar o assassinato dos prefeitos petistas Celso Daniel e Toninho, além de tráfico de influência e desvio de dinheiro público.

Folha - Quem a CPI dos Bingos ouvirá nesta semana?
Efraim Moraes
- Na terça-feira vamos ouvir o Ademirson [da Silva, assessor do ministro da Fazenda, Antonio Palocci]. Há uma indefinição em relação a quarta e quinta, mas devemos trazer os procuradores que atuam no caso de Santo André, [na investigação relativa ao assassinato do prefeito Celso Daniel, em janeiro de 2002].

Folha - Qual relação da morte do prefeito Celso Daniel com o jogo?
Moraes
- Estamos próximos de mostrar que havia ligações do [empresário de Santo André] Ronan Pinto com os bingos.

Folha - Que tipo de ligação?
Moraes
- Ligações empresariais, com pessoas envolvidas com o jogo do bicho.

Folha - O sr. pode explicar melhor?
Moraes
- Não posso porque o que estou buscando é exatamente essa questão. Estamos tentando provar exatamente que havia ligações do grupo de Santo André com o jogo.

Folha - E como a investigação de Ribeirão Preto, sobre tráfico de influência e desvio de recursos públicos, liga-se ao jogo?
Moraes
- Há uma posição governista de tentar ver a CPI como CPI dos Bingos. A CPI dos Bingos trata da contravenção, do crime organizado, que são os dois pontos mais fortes que envolvem o caso de Santo André. Você chega a Ribeirão Preto, tem a questão do desvio de recursos públicos. Temos informações da máfia dos jogos envolvida tanto em Santo André como em Campinas e Ribeirão. É claro que ninguém vai dizer a nós que estava [envolvido]. Estamos buscando exatamente isso, com o apoio do Ministério Público e da Polícia Federal.

Folha - Em que fase está hoje a CPI dos Bingos?
Moraes
- A CPI deve apresentar até o final do ano um relatório parcial, principalmente no que diz respeito a Santo André e à GTech. Quando fala em bingo, todo mundo só pensa em bingo, mas GTech é envolvida com a Caixa Econômica, que é jogo. Está bem claro que há um volume de recursos muito grande que envolve [contratos entre] a Caixa e a GTech e que não estão explicados, e nós sabemos que houve [pagamento de] propina para que fosse realizada a conclusão [prorrogação] dos contratos. Não posso avançar mais com você.

Folha - Mas está confirmado que houve propina?
Moraes
- Houve sim. [É] o caso do [advogado] Valter Santos Neto, da MM Consultoria, que deve voltar à CPI. Isso está comprovado. No relatório, vamos mostrar a relação da GTech com a MM. Não temos dúvida de que Valter Santos Neto entrou na história da GTech para receber e repassar propina no valor de R$ 5 milhões, que foi o valor que ele cobrou para [apresentar ao Superior Tribunal de Justiça] uma simples [ação] cautelar. Ele só assinou a cautelar para a GTech [ação com a qual a empresa impediu a Caixa de fazer uma licitação para renovar o contrato de operação do sistema de loterias]. Nada mais. E o custo foi de R$ 5 milhões. Buscamos a partir daí o envolvimento do [Rogério] Buratti, do Marcelo Rovai [diretor da GTech]... Queremos fechar essa questão com provas, com as quebras de sigilo que começam a chegar.

Folha - Quando a CPI vai ouvir os empresários de jogos?
Moraes
- Ouvimos o Carlos Cachoeira, o [Enrico] Gianelli [advogado da GTech, em abril de 2003, época em que a Caixa renovou seu contrato com a multinacional]. Não ouvimos ainda o Comendador Arcanjo [José Arcanjo Ribeiro] porque ele está entregue à polícia uruguaia. Não temos como ouvi-lo. É impossível. Assim que ele chegar ao Brasil, vamos ouvi-lo.

Folha - Qual a relação de Paulo Okamotto, presidente do Sebrae, com a CPI?
Moraes
- Ele pagou contas do presidente Lula. Foi para a CPI e não conseguiu dizer de onde veio esse dinheiro, por que pagou... A CPI tem uma amplitude nesse sentido. De onde veio esse dinheiro? Ele não esclareceu isso. O foco, nesse caso, é a dúvida com relação à origem do dinheiro.

Folha - Para o governo, a CPI só existe para atacá-lo.
Moraes
- Não existe isso. Quem mais tem tentado desviar o foco é o próprio governo, com essa história de "CPI do fim do mundo". É uma CPI diferente. Ela está apurando todos os casos ligados ao seu foco. Não interessa pra gente se é bom para o governo ou não é. E é essa a preocupação do governo. Se fizerem uma composição, vão ver que essa maioria [da oposição] na CPI não existe. A maioria acontece por conta dos fatos, da necessidade de apurar determinados fatos.
Não há nada disso, de que a CPI está fugindo do foco. É uma CPI que o governo não desejava -tivemos que instalá-la com determinação do Supremo- e que depois, devido ao seu trabalho, à sua transparência e à sua independência, começou a preocupar o governo.