sexta-feira, outubro 21, 2005

Luís Nassif - As operações de balcão

Luís Nassif - As operações de balcão


Folha de S. Paulo
20/10/2005

A entrevista de Lúcio Bolonha Funaro -dono da Garanhuns, empresa que teria sido utilizada por Marcos Valério para repassar recursos ao PL-, dada aos repórteres Mário César Carvalho e Janaína Leite, não teve a repercussão devida, talvez em razão da tecnicalidade do tema. Mas trata-se de uma das peças mais importantes na devassa que vem sendo feito sobre financiamentos de campanha e esquemas montados com fundos de pensão. A entrevista tocou em um dos nervos expostos do mercado: a falta de controle sobre as operações da BM&F (Bolsa de Mercadorias e Futuros).
A BM&F tem sistemas informatizados de última geração. Toda cotação que passa por esses sistemas torna-se transparente, porque divulgada simultaneamente em todos os seus terminais. Alertas automáticos podem ser acionados quando uma operação registrar oscilação suspeita, permitindo fiscalização total por parte do Banco Central ou da CVM (Comissão de Valores Mobiliários). Além disso, se alguém oferece um título por valor fora de mercado, haverá várias instituições oferecendo-se para comprar ou vender naquele preço, com o próprio mercado anulando a jogada.
Na época da CPI dos Precatórios, havia golpes com títulos estaduais porque as negociações eram feitas em balcão, sem passar por esses sistemas. A instituição A acertava a venda de um título para a instituição B, por um preço expressivamente maior, e ninguém podia interferir porque não havia oferta pública pelos terminais da Cetip.
Funaro -que está longe de ser um santo- chamou a atenção para dois casos graves. O maior deles é o fato de operações com títulos públicos da BM&F continuarem sendo feitas em mercado de balcão. Não tem lógica. São volumes imensos, envolvem recursos de reservas bancárias e operações de grandes investidores.
A inclusão dessas operações nos sistemas da BM&F é condição essencial para uma fiscalização eficiente. É tão óbvio que não se entende que nunca tenha sido exigido pelo Banco Central e pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários).
Essa falta de transparência reverte até contra as instituições sócias da BM&F. Recentemente, o Santander despediu vários operadores, depois de constatadas operações irregulares com uma corretora. Como sugeriu Funaro, basta um rastreamento dessas operações para descobrir vários esquemas que foram armados ao longo dos últimos anos -muitos deles envolvendo grupos políticos, entre os quais o esquema Delúbio.
Outra denúncia explosiva é em relação às CPRs do Banco Santos. A CPR é uma cédula emitida por um produtor rural, pessoa física ou jurídica, e avalizada por um banco. O Banco Santos entrou nesse mercado, emitiu CPRs sem garantia, vendeu a taxas elevadíssimas e tudo passou em branco. Omitiram-se a Bolsa Brasileira de Mercadorias, a CVM e o Banco Central, em um golpe que respondeu por um terço do rombo de R$ 2,9 bilhões do banco.