folha de s paulo
Surpreendentemente , o ano de 2005 está sendo muito bom para a economia mundial. O FMI prevê um crescimento global de 4,3%. A maior novidade é o pequeno impacto, até agora, da alta do preço de petróleo. Os modelos convencionais estimavam que um aumento de US$ 10 por barril reduziria o crescimento anual em 0,5%. O preço do petróleo subiu aproximadamente US$ 40 por barril desde 2002, portanto esse impacto deveria ser de 2% negativos. Como a economia mundial cresceu aproximadamente 3,3% anuais entre 93 e 2002, o resultado neste ano é realmente notável.
Para o Brasil, o desempenho da economia global é uma ótima notícia. Apesar de ter sido até recentemente uma economia muito fechada, o Brasil teve uma tendência a crescer mais nos anos em que a economia mundial foi melhor. A previsão do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), de que o PIB no Brasil deve crescer 3,5% neste ano, reflete em parte os bons preços para as nossas exportações que resultam da expansão mundial.
A previsão do Ipea para o Brasil está abaixo daquela do FMI para o crescimento mundial em 2005, mas, mais importante, está bem abaixo das taxas de crescimento previstas pelo Fundo para as economias emergentes (6,4%), ou os emergentes da Ásia (7,8%), ou mesmo os emergentes da Ásia depois de excluídas China e Índia (5,4%).
A performance sofrível da economia brasileira neste ano reflete também vários fatores internos. De positivo, temos as novas tradições de equilíbrio fiscal e estabilidade monetária, que elevaram a confiança dos investidores, o aumento da integração com o resto do mundo e a melhoria do ambiente de negócios que resultou das reformas microeconômicas. Do lado negativo, além da política monetária que nos premiou com o maior juro real do mundo, destacam-se a informalidade crescente, a nossa incapacidade de gerar inovações tecnológicas no mesmo ritmo que as economias emergentes da Ásia e a baixa taxa de investimentos em infra-estrutura.
Já escrevi recentemente nesta Folha sobre política monetária, informalidade e inovação tecnológica. A baixa taxa de investimento em infra-estrutura é outro problema grave. Um estudo de pesquisadores do banco central do Chile documentou que, de 1980 a 1997, a taxa de crescimento da infra-estrutura no Brasil foi muito inferior à taxa de crescimento da infra-estrutura nos tigres asiáticos. O estudo estima que, nesse período, no qual o Brasil cresceu muito menos do que os tigres, a falta de investimento em infra-estrutura foi responsável por mais de 1/3 dessa diferença de crescimento no PIB. As privatizações da década de 90 resultaram em aumento considerável dos investimentos em setores cruciais, como as telecomunicações, mas a combinação de incerteza regulatória com a falta de investimentos estatais ainda deprime o crescimento da nossa infra-estrutura.
O debate em torno dos gastos públicos é dominado pela discussão dos juros que incidem sobre a dívida. Mas, com a exceção do superávit primário, o que é arrecadado pelos governos é gasto com transferências, consumo ou (muito pouco) com investimento. Após poupar o superávit primário, os nossos governos dispõem de mais de 30% do PIB, o que excede a porcentagem de impostos pagos em qualquer um dos tigres. É evidente, então, que não falta aos nossos governos capacidade fiscal para realizar os investimentos necessários para mudar o nosso patamar de crescimento -o que lhes falta é a coragem política para cortar gastos correntes.