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Há boas notícias econômicas diariamente, reduzindo o impacto da crise política. A dívida externa caiu US$ 10 bilhões em seis meses, atingiu, em junho, o menor volume desde 97 e deve ter caído nos meses seguintes, para os quais ainda não há dado divulgado até o momento. Quase toda a dívida é de médio e longo prazo. A dívida de curto prazo é de apenas US$ 16,7 bilhões; quase toda privada ou do setor financeiro público.
A balança comercial já superou, antes de setembro terminar, o saldo previsto no começo do ano pelos analistas dos bancos. Eles haviam previsto para o ano um superávit de US$ 26 bilhões e hoje já é de US$ 31 bilhões acumulados. A previsão há muito tempo já foi revista para números sempre maiores até chegar ao nível de US$ 40 bilhões em que está hoje.
A queda da dívida tem sido provocada pela baixa taxa de rolagem, ou seja, os tomadores preferem quitar suas dívidas em vez de renová-las no vencimento. No primeiro semestre, a taxa de rolagem foi de 54%, não porque haja restrição de oferta de dinheiro para o Brasil, mas porque não há interesse por parte dos tomadores. De 99 até o fim do ano, segundo dados do Bradesco, a queda da dívida externa total, do setor público e do setor privado, será de US$ 40 bilhões. O total devido ao exterior era de US$ 225,6 bilhões, caiu para US$ 210 bilhões em 2002, voltou a subir um pouquinho no começo do governo Lula, mas depois caiu novamente; estava, em junho, em US$ 191,3 bilhões e vai cair mais até o fim do ano. Como as reservas dobraram de 99 para cá, a dívida externa líquida terá caído US$ 65 bilhões até o fim do ano.
O setor público pagou amortizações aos credores institucionais como FMI, Clube de Paris, Banco Mundial. No caso do FMI, está fazendo pagamentos antecipados. Apesar disso, o Tesouro está captando para cobrir compromissos de 2006. Deve captar mais US$ 2 bilhões até o fim do ano. Mesmo crescendo por essas operações, a dívida vai cair US$ 7 bilhões ao todo este ano. Nesses bons resultados estão os efeitos da queda do dólar, do bom momento internacional com fluxo para países emergentes, da boa estratégia de administração da dívida. Como conseqüência, o serviço da dívida tende a ficar mais baixo, e é bom lembrar que 70% do serviço da dívida são do setor privado.
O superávit primário do setor público consolidado está quase atingindo a meta, segundo as contas feitas nas análises do CSFB. Hoje, o superávit acumulado é de R$ 79,9 bilhões para uma meta total, no ano, de US$ 83,8 bilhões. "Para alcançá-la será preciso obter um superávit adicional de apenas R$ 1,2 bilhão por mês nos últimos quatro meses do ano", diz o banco. Esse resultado mostra que há folga fiscal. O ruim é a folga fiscal ser usada para liberação de emendas de parlamentares perto do momento de eleger o novo presidente da Câmara. Lembra nossos maus hábitos nas relações entre Executivo e Legislativo no Brasil.
O Itaú acha que o superávit primário estabelecido como meta para o ano, de 4,25%, será alcançado em setembro. Mesmo assim, vê nas contas públicas um risco: os benefícios previdenciários descolaram dos outros gastos e estão crescendo fortemente. Isso significa, na visão do banco, menos chance de queda da carga tributária.
Outro dado que tem animado analistas é o aumento do crédito livre no Brasil. O estoque de crédito livre cresceu 1,6% em agosto e 22,8% em relação a agosto do ano passado. O crédito para as empresas subiu pouco, 0,2% em agosto, mas o das pessoas físicas cresceu 3,1% no mês e 39% em relação a agosto de 2004. Quem nunca comeu melado, quando come, se lambuza, mas, por enquanto, não há sinal de que os consumidores estejam se atrapalhando no pagamento. A inadimplência cresceu só um pouco e foi para 6,1% do total emprestado à pessoa física.
Pelos dados da World Federation of Exchanges, Federação Mundial de Bolsas, a Bovespa saiu do 19 lugar para o 9 lugar em volume de recursos captados através de novos lançamentos de ações. Hoje a bolsa brasileira está entre as dez maiores do mundo com US$ 8,1 bilhões em novas captações. O Brasil está à frente de vários países emergentes, como Índia e Coréia, e até de grandes bolsas como a da Espanha, de Frankfurt e a Nasdaq.
Da área política, não vem notícia boa alguma. Pelo contrário. A Câmara revive o mesmo ambiente de divisão política que levou à eleição de Severino Cavalcanti. O baixo clero não tem poder de voto para eleger o presidente. Severino só foi eleito pela incapacidade do governo de fazer uma articulação política minimamente satisfatória. A propósito, o candidato do governo, Aldo Rebelo, é quem fazia a articulação na época. O deputado é boa gente, felizmente, mas ele era ministro da articulação quando tudo o que está sendo investigado aconteceu. Mesmo assim, o presidente ungiu-o como seu favorito e, de quebra, fustigou um pouco mais as fraturas do PMDB, quando mobiliza Renan Calheiros do PMDB governista a cristianizar a candidatura de Michel Temer. Portanto, a crise na política não dá trégua, apesar dos bons ventos que sopram da economia.