sábado, agosto 27, 2005

O Planalto só tem energia para cuidar do escândalo

Quase parando

Na semana em que se compara a JK, Lula
despenca 10 pontos na confiança popular


João Gabriel de Lima

 
Gustavo Miranda/Ag. O Globo
Lula, com Roriz: agora vale até dar ambulância ao lado de inimigo clássico



Em seus discursos diários, o presidente Lula tem feito questão de afirmar que, apesar do maremoto da crise, o governo funciona, o país segue em frente e as instituições mantêm-se sólidas. É natural que o presidente procure transmitir uma sensação de normalidade à sociedade, mas é incorreto dizer que o governo está em ritmo normal. Depois que a crise entrou em fase crônica, e especialmente depois que o ministro Antonio Palocci foi sugado para o centro dela, o Palácio do Planalto rendeu-se à paralisia administrativa e só reúne energias para tentar combater os desdobramentos das denúncias. Nas reuniões matinais de Lula com cinco ministros, introduzidas na reforma ministerial de julho, nunca se debateu um ato ou programa de governo. Fala-se só de formas para superar a crise. Dos 1.819 projetos no Orçamento, 1.219 não receberam um tostão neste ano. Ou seja: mais de dois terços dos programas federais não saíram do papel. Para contribuir com a letargia, o governo recebeu outra notícia paralisante: pela primeira vez, uma pesquisa mostra que a maioria dos brasileiros, 52%, não confia em Lula.

Os reflexos eleitorais do novo panorama são evidentes: se a eleição fosse hoje, Lula chegaria em segundo lugar já no primeiro turno, coisa que nenhuma pesquisa apontara até agora. Seu adversário mais forte é o tucano José Serra, prefeito de São Paulo. A pesquisa é ruim para o governo pelos números que exibe e pelo futuro que projeta. Com o governo atolado na crise, Lula tem feito tudo para, se não aumentar, ao menos preservar seu cacife eleitoral. Na semana passada, o presidente chegou ao extremo de estrelar uma cerimônia chinfrim de entrega de ambulâncias ao lado do governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz, um inimigo clássico do PT e um símbolo de traquinagens públicas tão emblemático quanto Paulo Maluf. Pelos dados da pesquisa, o esforço intenso de Lula para manter sua popularidade não tem produzido os resultados esperados.

No contexto de um governo que não anda e uma popularidade que cai, o presidente disse, em discurso no Planalto, que não pretende se suicidar como Getúlio Vargas nem renunciar como Jânio Quadros ou João Goulart – que, em verdade, foi deposto pelo golpe militar de 1964 – e comparou-se com o presidente Juscelino Kubitschek. "Crise, neste país, levou o Juscelino a ser mais achincalhado do que qualquer outro presidente da história deste país", improvisou Lula. Ombrear-se, ainda que de maneira forçada, àquele que é considerado o Pelé dos presidentes faz sentido do ponto de vista propagandístico. O problema é que, ao invocar JK, Lula faz paralelo entre situações incomparáveis. No tempo de JK, o Brasil não tinha instituições tão sólidas, o Ministério Público não fustigava os políticos e a imprensa andava a reboque de interesses eleitoreiros, dando voz a diatribes infundadas apenas para açoitar rivais políticos. Agora é diferente – e o mensalão já produziu recibos bancários, confissões de alguns protagonistas, fitas de vídeo...