| Na presidência da sessão em que o presidente nacional do Partido Liberal (PL), Valdemar Costa Neto (SP), renunciou ao mandato de deputado federal, seu colega Severino Cavalcanti (PP-PE) mandou publicar esta decisão antes que algum desavisado a pusesse em dúvida. E, para surpresa geral, elogiou a iniciativa: 'Não posso deixar de ressaltar a prova da dignidade da maneira correta como Vossa Excelência agiu para engrandecer o mandato popular que espero que São Paulo faça (sic) de volta.' Em seu linguajar pitoresco e, sobretudo, fiel ao próprio conceito de moral política, o segundo substituto eventual do presidente da República agrediu, neste elogio gratuito, o bom senso e a ética, além de dar uma idéia exata do equívoco de seus conceitos sobre a representação popular. Fê-lo expondo de maneira inequívoca o real motivo que levou o ex-colega à renúncia: a perspectiva de reconquistar o mandato nas eleições de 2006, afastando o risco de longas férias parlamentares de oito anos, prazo da inelegibilidade prevista por uma eventual sentença de cas sação de direitos políticos resultante de investigações que venham a comprovar a procedência da denúncia do deputado Roberto Jefferson, presiden te nacional afastado do PTB, que o acusa de ser um dos beneficiários do 'mensalão' - segundo a denúncia, uma remuneração mensal feita pelo PT a parlamentares da base aliada para mudarem de partido ou votarem a favor de projetos de interesse do governo petista. O recurso à renúncia não é inédito. Muitos dos acusados no escândalo dos 'anões do Orçamento' usaram o estratagema e alguns recuperaram, em eleições posteriores, os mandatos antes ameaçados de cassação pela pressão da opinião pública. Há um caso mais recente e também ruinoso para a imagem da instituição perante a opinião pública: os então sena dores Antonio Carlos Magalhães (PFL-BA) e Jader Barbalho (PMDB-PA) protagoniza ram uma briga de rua e, antes de serem processados no Senado, renunciaram aos mandatos. Na eleição seguinte, volta ram ao Congresso, um como
Há contra Valdemar Costa Neto, contudo, uma agravante, até mesmo em relação aos exemplos citados. Ao contrário dos parlamentares que antes dele recorreram ao estratagema e nunca confessaram publicamente os crimes de que fo ram acusados, o ainda presidente nacional do PL negou ser beneficiado por pagamentos do 'mensalão', mas confessou ter recebido dinheiro do PT, admitindo ter sido 'induzido a erro'. Ou seja, trata-se de réu confesso que nem mesmo pode apelar para o benefício da dúvida, preceito jurídico pretextado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para man ter em seus cargos auxiliares acusados de irregularidades. A cidadania não vê com bons olhos esse privilégio que seus representantes no Poder Legislativo têm em relação aos cidadãos comuns - renunciar ao mandato para se livrar de penas por delitos eventualmente cometidos. O presidente nacional do PL, repetimos, continua no cargo partidário, sem que seus correligionários se mobilizem para dele deslocá lo. Um deles, o vice-presidente José Alencar, chegou ao acinte de elogiar a coragem do gesto de Valdemar, que confessou ter praticado crimes eleitorais. Ainda mais execrável foi o pronunciamento extemporâneo do presidente da Câmara dos Deputados, considerando o artifício da renúncia para se livrar da pena, mesmo tendo sido o delito confessado, uma prova de dignidade e um motivo para que recupere nas próximas eleições o mandato ao qual teve de 'abrir mão'. Apesar de partir de alguém que já mostrou que não tem noção de compostura, o elogio estapafúrdio da terceira autoridade da linha da sucessão presidencial espanta pelo cinismo. Não são poucos os políticos que se eximem de punir seus 'nobres pares', transferindo a responsabilidade para o eleitor nas eleições seguintes. Severino Cavalcanti fez pior que estes ao eleger o eleitorado paulista como cúmplice de seu colega Valdemar, apelando pa ra que este reconquiste nas urnas um mandato de que foi obrigado a abrir mão por haver violado a lei, ferindo regras elementares do decoro parlamentar. | |||||||||||||
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