Oposicionista na base, dividido na direção e governista no Congresso, o PMDB faz seus preparativos para alterar essa correlação de forças e, gradativamente, desembarcar "au grand complet" da nau petista. Ontem à tarde, combinava-se no partido uma conversa séria para de noite com o presidente do Supremo Tribunal Federal, Nelson Jobim, e acertavam-se os últimos detalhes para a reunião da direção executiva, hoje de manhã, na qual o PMDB oficializará o início do fim de uma aliança até então sustentada pelo apoio da maioria dos deputados e da quase totalidade dos senadores. A contabilidade mais recente mostra que agora os oposicionistas já são a metade da bancada de 86 deputados e um terço da representação de 22 senadores. A expectativa é de, nos próximos dias, aumentar a força da oposição na proporção inversa ao enfraquecimento político do governo. Na reunião da executiva, o partido anunciará o reforço a duas decisões tomadas na convenção nacional do ano passado: a definição da data das primárias para a escolha do candidato a presidente em 2006 e a demissão do governo, ou desfiliação do partido, dos ocupantes de cargos federais. Na época, a direção do PMDB fingiu ignorar o descumprimento daquela decisão porque ainda tinha algum interesse de compor unidade com a ala governista. Agora a coisa mudou; a idéia é partir para o enfrentamento, enviando os casos dos ministros para a comissão de ética do partido e denunciando a formação da maioria como "espúria" e sustentada "a poder de mensalão". Na conversa marcada para ontem à noite com Nelson Jobim, os pemedebistas iriam pedir a ele uma posição mais firme a respeito da possibilidade de vir a ser o candidato do partido à Presidência da República. Para isso, estavam dispostos a lhe dar prazo até fevereiro para decidir antecipar sua saída do Supremo Tribunal Federal (prevista para abril) e se inscrever nas prévias a serem disputadas em março também por Anthony Garotinho e, provavelmente, pelos governadores Germano Rigotto, do Rio Grande do Sul, e Roberto Requião, do Paraná. Na semana passada, a cúpula do partido queria que Jobim se definisse em dezembro, argumentando que, se estivesse mesmo interessado em concorrer, teria de apresentar-se a tempo de construir uma alternativa consistente a Anthony Garotinho, cuja candidatura dispõe de índices significativos nas pesquisas, mas não é bem vista pela direção. Até para efeitos de negociações futuras, principalmente com o PSDB, o presidente do Supremo é tido como melhor opção. Entre outros motivos porque o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso adoraria tê-lo como vice. Meia-volta Advogados tentam postergar depoimento de Rogério Buratti na CPI dos Bingos alegando problemas de saúde física, mental e psicológica. Consta tratar-se de síndrome de fidelidade recém-readquirida. Arrastão Há mais ou menos um mês, o deputado José Dirceu avisou ao presidente da CPI dos Correios, senador Delcídio Amaral, que se fosse àquela comissão era capaz de "arrastar" consigo o País. Por esta ou por outra, Dirceu ainda não teve a data de seu depoimento marcada. Mas já "arrastou" metade do governo para o banco dos depoentes, ao chamar como testemunha de defesa no Conselho de Ética da Câmara o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. A outra metade, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, está na dependência do ânimo de Rogério Buratti. Ao vizinho A filósofa Marilena Chaui alega, sobre o escândalo em curso, que seu dever intelectual é manter silêncio obsequioso até conseguir compreender melhor as circunstâncias da crise. Ainda assim, na condição de militante do PT faz algumas considerações - na forma de monólogo - sobre os equívocos do partido, sendo um dos mais graves, na opinião dela, a prioridade dada à reforma da Previdência "que o Fernando Henrique não teve coragem de fazer". A reforma do setor privado foi feita no governo FH; a do setor público fracassou em quatro de suas cinco tentativas por obra e graça da oposição do PT. Também escapa à memória e à percepção da professora a natureza das coisas de um modo geral. Em seu pronunciamento no seminário "O Silêncio dos Intelectuais", atribuiu o drama a respeito do qual ela ainda não firmou compreensão ao instituto da política de alianças. "Durante anos, o PT foi violentamente criticado por não fazer alianças, já que partido moderno tinha de fazer alianças. Aí ele fez..." e resultou nisso que se viu, analisou. Nesse ritmo de atribuição de responsabilidades ao vizinho, a filósofa vai acabar concluindo que a culpa do que se vê é dos políticos sérios que não abandonaram seus projetos e respectivas legendas para se acoplar ao PT, deixando ao partido apenas a opção de se juntar aos vendidos.
| |
| |
quarta-feira, agosto 24, 2005
DORA KRAMER De mala e cuia
O ESTADO DE S PAULO