O mundo provavelmente achará isso muito esquisito, e é estranho mesmo. Dos governos civis, o do PT é o que mais dificuldades tem na convivência com a imprensa.
A ausência de entrevistas e acesso restrito ao presidente eram comuns nos governos militares. A partir de José Sarney, todos os presidentes foram de alguma forma disponíveis; cada um à sua maneira, uns mais, outros menos, mantinham uma sistemática de relacionamento com jornalistas.
Em viagens, nacionais ou internacionais, era de praxe o contato com os profissionais encarregados na cobertura. Quando Lula assumiu, a primeira providência foi a instituição do distanciamento entre o presidente e a imprensa.
Houve casos em que dirigir uma pergunta a Lula foi tratado como conduta ofensiva e passível de reação agressiva. Não se pode esquecer que, no início do Governo, tentou-se a imposição de uma lei geral do silêncio em todas as esferas do poder federal, coisa que obviamente não deu certo.
Lula sempre resistiu a contatos mais livres e freqüentes com jornalistas, embora a razão disso nunca tenha sido esclarecida. Ele jamais falou a respeito em público, mas opiniões de auxiliares importantes, a concepção dogmática do partido, sua visão disciplinada e hierarquizada da política ajudam a entender um pouco a origem do receio.
Sempre muito festejados quando eram oposição, os petistas têm enorme dificuldade de lidar com o contraditório. Tendem a receber as críticas como manifestações inimigas.
Embora o PT ao longo de sua história sempre tenha contado com enorme condescendência no meio jornalístico – seja por identidade ideológica ou constrangimento de conferir aos defensores dos fracos o mesmo rigor de tratamento reservado aos arautos dos fortes –, os petistas avaliam que recebem da imprensa um tratamento hostil.
O ministro da Comunicação e Gestão Estratégica, Luiz Gushiken, externa claramente essa posição. Para ele, os jornalistas são muito mais rigorosos com o PT do que com outras forças políticas. Gushiken cobra atenção à agenda positiva e vê nas críticas um exercício de injustiça e intolerância.
Apesar de todas essas convicções um tanto paranóicas, aos poucos a impressão de que a tensão entre imprensa e Governo precisaria ser desfeita foi ganhando aceitação.
Mas, convenhamos, a necessidade e recuperação de prejuízos políticos funcionou como o argumento muito mais eficaz do que qualquer profissão de fé em prol do compromisso do ente público com a livre informação.
Não por acaso, desde o primeiro ano há coincidência entre pesquisas de popularidade desvantajosas para o Governo e algum tipo de encontro preparado pela Secretaria de Imprensa com o presidente da República.
Nos primeiros dois anos do Governo, tais conversas foram organizadas por grupos, ora de alguns jornais escolhidos, ora de emissoras de rádio, correspondentes estrangeiros, ou mesmo repórteres escalados para acompanhar Lula em alguma viagem internacional.
O motivo da concordância em finalmente adotar o mais trivial dos modelos, a entrevista coletiva, ninguém sabe dizer exatamente qual foi. Mas alguma suposição bem próxima da realidade é possível fazer.
Chegando à metade do mandato, Lula acabou convencido de que não poderia terminar seus quatro anos sendo o único presidente da redemocratização para cá a não dar uma única entrevista no formato tradicional.
Agora isso é mostrado como um grande marco de Governo, como se o presidente Luiz Inácio da Silva, ao dar a entrevista, tivesse feito uma grande e democrática concessão.
A questão é inversa: o ineditismo ressalta a resistência e a evidência de que Lula não considera uma obrigação inerente ao mandato submeter-se ao constante escrutínio dos meios de comunicação, o canal livre de diálogo entre Governo e sociedade.
Arquivos implacáveis
No tumulto da semana plena de acontecimentos, acabou ficando em segundo plano um assunto que merece atenção mais apurada: a preocupação dos escritórios de advocacia com ações de busca e apreensão por parte da Polícia Federal.
Por causa disso, a Ordem dos Advogados do Brasil requer o cumprimento de uma lei federal que dá o direito à OAB de acompanhar as operações nos escritórios.
O argumento é que na busca e apreensão a polícia acaba tendo acesso a documentos de clientes estranhos ao objeto da investigação, que originou o mandato, violando, assim, o sigilo profissional.
Esse é um lado da história e até faz sentido. O outro lado é a proteção que se estabelece a todo e qualquer tipo de conexões dos escritórios de advocacia com os mais diversos ramos de atividade. E aí incluem-se do cliente traficante aos cartórios de registros importantes e até o Poder Judiciário.
O DIA
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.