quinta-feira, março 31, 2005

Folha de S.Paulo -LUÍS NASSIF:Uma inclusão meritória




A proposta mais racional sobre políticas compensatórias para acesso às universidades foi desenvolvida pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas): o Paais (Programa de Ação Afirmativa e Inclusão Social).
Partiu-se de um levantamento de vestibulares passados para analisar o desempenho dos alunos. Chegou-se a conclusões óbvias, embora relevantes. Todo excluído vem da escola pública. Entre os excluídos da escola pública, os mais excluídos são os pretos (para usar a terminologia do IBGE), os índios e os pardos. Mas nem todo preto é excluído, porque parte vem de escolas privadas.
No curso, entre grupos de alunos de mesma nota nos vestibulares, os que vieram de escola pública tiveram desempenho superior. Se, em desvantagem no vestibular, alcançaram a mesma nota, em igualdade de condições, nos cursos, se saíram melhor. Logo, mesmo que haja diferença de preparo de saída -que não seja excessiva-, ela poderá ser compensada ao longo do curso.
A partir daí, definiram-se dois critérios de políticas compensatórias:
1) todo aluno de escola pública recebe um bônus de 30 pontos adicionais no vestibular;
2) dentro desse grupo, os que se declararem pretos, pardos ou indígenas receberão num adicional de 10 pontos. Em cursos de competição média, a nota de corte é 500. Em cursos com maior competição, como medicina, é 600. Trinta a 40 pontos fazem diferença, mas não estabelecem desníveis insuperáveis. Ou seja, não basta ser preto, pardo ou indígena: é preciso, primeiro, ser pobre.
O mais importante na medida foi ter estimulado os excluídos a se habilitar ao vestibular. Do vestibular de 2003 ao de 2005, o percentual de candidatos isentos de taxa de matrícula (com renda familiar abaixo de dois salários mínimos) aumentou de 4,4% para 13,3%; a proporção de aprovados egressos da escola pública saltou de 24,5% em 2000 para 32,8% em 2005. Do lado dos pretos, pardos e indígenas, o total de aprovados pulou de 9% em 2003 para 15,1% em 2005. A participação dos isentos foi de 1,2% em 2000 para 6,4% em 2005 -crescimento de 93%, o mais significativo de todos.
Para os cursos mais procurados, o crescimento superou a média. Na medicina, são 82,9 candidatos por vaga. Em 2004, dos 110 aprovados, 7 eram egressos da escola pública e 10 eram também pretos, pardos e indígenas. Em 2005, o primeiro grupo pulou para 29, e o segundo, para 19.
Importante: a ampliação da oferta de cursos noturnos ajudou substancialmente na colocação desses grupos, que, por falta de renda, são obrigados a trabalhar para se sustentar. Em primeira chamada, para o período integral, os alunos da escola pública representaram 17% dos aprovados em 2004 e 25% em 2005. No noturno, o índice de aprovação foi de, respectivamente, 40% e 51%.
Com o sistema de pontuação, respeitou-se a meritocracia, não se criaram resistências nos demais grupos, não se criou o estigma da cota, não houve desníveis de preparação que não pudessem ser compensados com esforço e talento.

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