"Duda Mendonça prometeu me ajudar.
Agradeci e perguntei: 'O presidente
apresentou como novas ambulâncias
repintadas. Ele não é como uma ambulância
velha, repintada pelo senhor?' "
Acordei invocado. Peguei o telefone e liguei para o Palácio do Planalto.
– Quero entrevistar o Lula.
A telefonista transferiu a chamada para a Secretaria de Imprensa do presidente. O chefe do departamento, Ricardo Kotscho, informou-me que iria encaminhar o pedido de entrevista ao responsável pelo agendamento, acrescentando, de forma desalentadora, que uma penca de jornalistas de todas as nacionalidades estava à minha frente.
Como eu continuava invocado, e não queria saber de esperar meses e meses, liguei para o Ratinho, que recentemente conseguiu furar a fila de jornalistas e entrevistar Lula na Granja do Torto, com direito a churrasco e recital de sanfona. Ratinho se comprometeu a interceder em meu favor, aconselhando o presidente, seu amigo, a me receber prontamente. Ratinho me assegurou também que eu ficaria encantado com Lula, porque sua equipe é uma porcaria, mas ele é uma pessoa da melhor qualidade, tanto que foi o único que se preocupou em distribuir dentaduras aos pobres.
O empenho de Ratinho não aplacou meu ímpeto. Resolvi ligar para Duda Mendonça. Sua secretária despejou sobre mim uma gravação de Caetano Veloso cantando Nirvana. Fiquei ainda mais invocado do que antes. Duda Mendonça explicou que raramente se encontra com Lula, mas pretende vê-lo na semana que vem, para mostrar-lhe sua última campanha publicitária, aquela que compara dados de doze meses de Fernando Henrique com os de catorze de Lula. Duda Mendonça prometeu me ajudar a conseguir a entrevista. Agradeci e perguntei:
– O presidente apresentou como novas cinco ambulâncias que tinham sete anos de uso, mas foram repintadas para a ocasião. Ele não é como uma ambulância velha, repintada pelo senhor?
Modestamente, Duda Mendonça respondeu que não. Ele foi o maior responsável pela eleição de Lula. O destino o puniu infligindo-lhe a contratação de Luis Favre, o marido da prefeita Marta Suplicy.
A seguir, pensei em telefonar para José Dirceu, mas li que ele não apita mais nada no governo. Liguei então para Frei Betto, um dos melhores amigos de Lula. Ele não me atendeu. Voltei a ligar no dia seguinte. Ele estava em reunião. Liguei no outro dia. Ele continuava em reunião.
Cada hora mais invocado, procurei na internet o número da Secretaria de Comunicação e liguei para Luiz Gushiken. Como ele não estava, falei com um de seus assessores, que me recomendou ligar para o todo-poderoso secretário particular do presidente, Gilberto Carvalho. Antes de trabalhar com Lula, Gilberto Carvalho era o principal colaborador do prefeito assassinado de Santo André, Celso Daniel. O irmão de Celso Daniel, em depoimento à Justiça, acusou Gilberto Carvalho de conhecer os esquemas de propina da prefeitura e de ter entregue, pessoalmente, o dinheiro arrecadado a José Dirceu. Ocorreu-me que, além de pedir uma entrevista, valeria a pena aproveitar o telefonema para ouvir a versão de Gilberto Carvalho sobre o caso, mas ele preferiu não retornar minhas ligações.
No futuro, quando eu acordar invocado, acho mais fácil falar com o Bush.10/5/2004
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