domingo, abril 22, 2012

Ajudar a Europa, por quê? - ALBERTO TAMER

O Estado de S.Paulo - 22/04/12



E quem diria? A tradicional reunião do FMI, que sempre se destinou a analisar a economia mundial, apontar desafios e apresentar soluções, transformou-se esta semana na busca desesperada por recursos para enfrentar a crise financeira na zona do euro. Ela se atenuou com o empréstimo de 1 trilhão na capitalização dos bancos europeus, mas nada mudou a médio prazo. Apenas se ganha tempo para rolar a dívida, que continua aumentando. "Há uma calma desconfortável, incômoda, e a sensação de que a qualquer momento a coisa pode ficar muito ruim, piorar novamente", afirmou o economista-chefe do Fundo, Olivier Blanchard, num tom sombrio. Ele foi seguido pela diretora-gerente Christine Lagarde, que teme "novas turbulências" no mercado europeu. A situação é séria, insistiam os dois, à exaustão.

Deu certo. E a retórica funcionou. O FMI obteve quase tudo o que pedia. No início da reunião falava em US$ 500 bilhões. Na quinta-feira, as primeiras ofertas informais ficavam entre US$ 350 bilhões, US$ 380 bilhões, mas no fim da tarde de sexta-feira o FMI confirmou em nota oficial que havia ofertas de US$ 430 bilhões. Destes, US$ 200 bilhões virão da própria zona do euro e o restante de 11 países. O Fundo espera mais e fez uma espécie de apelo aos países emergentes, exatamente os que estão mais preparados para enfrentar um agravamento da crise.

Brics ainda não. O Brasil e os países do Brics não constavam dessa lista, mas no dia anterior a China falava em US$ 60 bilhões e o vice-ministro de Finanças da Rússia, Sergei Storchak, mencionava também esse valor. O ministro Guido Mantega foi cauteloso. "A posição unânime do Brics é dar suporte... aumentar os fundos do FMI, mas não vamos divulgar montantes", disse Mantega ao fim do encontro dos ministros de Finanças e dos presidentes dos bancos centrais do G-20, em Washington.

Cotas. "Nós condicionamos essa ajuda (aos membros do FMI) à conclusão da reforma das cotas, para que nós, mercados emergentes, possamos ter mais representação. Isso está no comunicado", afirmou Mantega. Há resistência da própria União Europeia. Ela propõe um critério de distribuição de cotas que a favorece. Antes dessa reunião, o ministro havia sido mais crítico e incisivo. Eles são ótimos. Pedem muito, mas não querem dar nada.

Brics 'desbricado'. Só que o Brics, como afirmou textualmente Lagarde, "não é mais do que um termo 'bacana' inventado pelo Goldman Sachs, se me recordo...Têm questões cambiais e projetos diferentes entre si." Mas o que a nossa Christine Lagarde estava querendo dizer com isso? Ora, é elementar, meu caro Watson, O Brics está dividido. A China e a Rússia já falam em US$ 60 bilhões cada um. Os chineses têm interesse em exportar mais produtos acabados e os russos, petróleo para um mercado europeu com PIB de mais de US$ 14 trilhões. Sem petróleo, a Rússia quebra.

A China vai sozinha. A China tem grande poder de negociação, pois absorve nada menos que 21% de todas as exportações europeias e a crise na zona do euro já provocou queda de 12%. Entre janeiro e outubro, a UE exportou para a China mais de 112 bilhões, ante € 92 bilhões no mesmo período de 2010. Os números impressionam. Sobram Brasil, Índia a África do Sul, sem grande importância...

Vejam os outros. Há mais. Na lista dos mais comprometidos em ajudar o FMI estão Arábia Saudita com US$ 15 bilhões, financiando indiretamente suas exportações de petróleo; a Coreia, com outros US$ 15 bilhões. E há mais US$ 15 bilhões da Grã-Bretanha, que mesmo sem estar na zona do euro tem seus bancos comprometidos lá e não quer ver o seu grande parceiro comercial afundar na recessão.

Comércio gigantesco. A China vai ajudar direta ou indiretamente a socorrer a Europa, sim, porque o comércio entre eles é gigantesco, US$ 576 trilhões no ano passado. Nesse cenário de gigantes comerciais, o Brasil não tem nada a esperar, nem mesmo esse aumento das cotas que reivindica. É simbólico porque temos pouco mais de 1%, e eles, Europa e Estados Unidos, com a enorme maioria dos votos, continuam controlando as decisões.