terça-feira, janeiro 31, 2012

TCU, o mordomo da hora - Denise Rothenburg



Correio Braziliense - 31/01/12


Se as obras dos aeroportos não ficarem prontas a tempo da Copa, não terá sido a primeira vez em que o país deixou de fazer algo dentro do prazo correto em prol de benefícios eleitorais. Vide o plano Cruzado, no governo Sarney



A semana política será tensa em Brasília. Não, nada a ver com o retorno dos parlamentares ao trabalho. Até porque os congressistas só devem trabalhar de fato na semana que vem, quiçá, como dizia minha avó, depois do carnaval. O motivo de cenhos franzidos, especialmente, no governo, é a expectativa de o plenário do Tribunal de Contas da União (TCU) votar amanhã parecer com sugestões de mudanças no edital de privatização dos aeroportos de Brasília, de Viracopos e de Guarulhos.

Se o tribunal decidir mudar as regras, o leilão poderá ser adiado mais uma vez, comprometendo o apertado calendário de melhoria da infraestrutura aeroportuária para a Copa de 2014. Nada indica que o TCU deixará esse edital intacto. A perspectiva é de que o tribunal proponha a redução do percentual de 49% que a Infraero deseja ter nos consórcios. Se houver proposta de alteração, até que se chegue a um acordo, dá-lhe atraso.

Dentro do governo, entretanto, a saída para esse imbróglio perante o público é a mais simples: se atrasar, põe a culpa no tribunal e ponto. Simples assim. Pelo menos é o que parte do governo tentará vender. O difícil é fazer com que a população acredite que a culpa é do TCU.

O Brasil foi anunciado sede da Copa de 2014 há mais de quatro anos, em outubro de 2007. Ou seja, tempo suficiente para fazer tudo, inclusive privatizar todos os aeroportos, se fosse o caso. Mas, não se fez por questões políticas. Àquela altura, o governo não tinha recursos para jogar tudo nos aeroportos e tampouco seria interessante para o PT se render a concessões desses serviços, dando a mão à palmatória.

O PT passou a vida criticando as privatizações. Até hoje, sempre que pode, o partido busca um dindim eleitoral batendo nessa tecla. Se esquece de que, se o Brasil mantivesse estatal o sistema de telefonia, por exemplo, talvez os celulares fossem privilégio dos mais abastados.

Por falar em abastados...
Não foi por falta de projeto que o governo Lula deixou de promover a concessão dos aeroportos. Em 2008, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), cheio de recursos, tentou deflagrar estudos para privatização desses serviços. Foi contido por ordens expressas do Palácio do Planalto. No ano seguinte, nova tentativa. Tudo em vão.

Lula havia vencido a sua segunda eleição em 2006 contra Geraldo Alckmin anunciando aos quatro ventos os perigos que o Brasil correria, caso entregasse o governos nas mãos do PSDB. Na corrida eleitoral, o PT dizia que, além de acabar com os avanços sociais obtidos no governo Lula, o PSDB estava vendendo as joias da coroa.

Alckmin passou então a desfilar com uniforme da Petrobras e também não fez a defesa das privatizações que deram certo. Tampouco sustentou a necessidade de infraestrutura aeroportuária — tema que os próprios brasileiros só se deram conta de uma maneira mais geral depois de outubro de 2007, quando o país foi anunciado sede da Copa do Mundo. Foi uma festa só. Infelizmente, não tínhamos ali um sujeito de plantão para gritar "vadda bordo, Lula! " a fim de colocar todo o governo engajado em preparar a infraestrutura necessária ao crescimento do país e aos eventos que buscou sediar.

Enquanto todos percorriam palanques, o tempo passou e agora estamos a quase um ano da Copa das Confederações, daqui a pouco estaremos a dois anos da Copa de 2014. Infelizmente, até agora, os leilões não aconteceram e os riscos de atraso são reais.

Se as obras dos aeroportos não ficarem prontas a tempo da Copa, não terá sido a primeira vez em que o país deixou de fazer o necessário dentro do prazo correto em prol de benefícios eleitorais. No governo Sarney, o Plano Cruzado precisava de correções de rumo que não ocorreram à época, 1986, para que o PMDB faturasse nas urnas. O partido ganhou quase tudo e o plano fracassou. A nós, meros observadores da cena, resta torcer para que a história não se repita. E fazer isso da mesma forma que, em 2014, torceremos para a Seleção Brasileira ficar com a taça. Afinal, não custa sonhar.