terça-feira, novembro 25, 2008

Em gelo fino Miriam Leitão

O GLOBO

Barack Obama montou uma equipe com experiência e sangue novo, pragmatismo e visão teórica. Equilibrou-se em fina trilha: demonstrar que já está em atividade e tem plano de ação, mas sem aumentar o vácuo de poder neste desastroso fim do governo Bush. Mas poderá Obama criar empregos com a economia em recessão? Salvar as montadoras e desenvolver a energia limpa?

O pai de Timothy Geithner, o economista nomeado secretário do Tesouro do governo Obama, falava tão bem do filho para os amigos da Fundação Ford que havia quem pensasse que era exagero de pai, contou-me ontem, divertido, um desses colegas, o economista Tom Trebat.
O trabalho do pai deu ao filho a chance de experiência internacional diversificada muito valorizada hoje em dia.
Obama, ontem, ressaltou que ele viveu na África e na Ásia, estudou chinês e japonês.
"Entende a língua dos mercados de hoje em mais de uma forma." Uma das formas que ele conhece o mercado é como um dos membros da equipe de salvamento que está atualmente em ação para evitar o pior nestes dias tempestuosos. Neste fim de semana mesmo, estava trabalhando na operação de resgate do Citigroup.

— Diria que ele é uma escolha muito abençoada, pois é tranqüilo, seguro, conhece o assunto e nunca foi executivo de bancos com papéis tóxicos — disse Trebat.
Ele já trabalhou com Larry Summers na Secretaria do Tesouro do governo Clinton. O temperamento abrasivo de Summers não será uma fonte de conflito? Tom acha que não, porque eles são amigos.
Agora, Geithner será a estrela maior, mas Summers também terá seu papel. Inicialmente cogitado para o Conselho de Assessores Econômicos, ele acabou nomeado para diretor do Conselho Econômico Nacional, um órgão não apenas consultivo.
Há dois consensos sobre Summers: ele é polêmico e brilhante. Tem enorme capacidade de fazer inimigos, e igual capacidade de formulação econômica. "Estou feliz de tê-lo ao meu lado", disse Barack Obama. Tomara que a sobriedade de Obama ajude a conter as gafes de Summers.
Ele perdeu o cargo de presidente de Harvard por ter dito que mulheres não têm capacidade inata para ciência e matemática. Disse que o mundo rico deveria exportar as fábricas poluidoras para os países em desenvolvimento.
Garantiu ao Brasil que o Plano Real fracassaria.
Em 1988, perguntei ao professor Dionísio Carneiro que economista americano faria sucesso no futuro. Ele disse: Lawrence Summers. Naquela época, ele era professor e, desde então, não pára de ocupar postos importantes. Ontem, Dionísio repetiu o que achava há 20 anos. Que ele é brilhante. Curioso é que Summers e Robert Rubin no governo Clinton tiraram o país da recessão do fim do governo Bush pai, mas com medidas ortodoxas, ajuste fiscal. Agora, ele promete fazer isso expandindo gastos.

— Aquela recessão era diferente, não apenas pela intensidade.
Ela se baseava na desconfiança no futuro fiscal do país, as projeções da dívida americana eram explosivas.
Por isso, eles atuaram para reverter essa dúvida, produzindo um ajuste que funcionou. Deram o equilíbrio fiscal que se esperava. O desafio agora é outro. Os gastos públicos americanos subirão, mas não podem ser permanentes.
Ele disse que há leituras apressadas de Keynes.

— O que Keynes disse é que há um momento em que a política monetária não é suficiente para estimular a economia, porque as pessoas tendem a adiar os gastos.
Neste momento que entra o estímulo fiscal — disse.
Se a política de Clinton foi ortodoxa, a política agora, com pessoas que trabalharam no outro governo, terá que ser mais heterodoxa, explicam os economistas.
Obama anunciou dois homens e duas mulheres. Uma delas é a professora Christina Romer, que será a chefe do grupo de conselheiros econômicos.
Obama disse que ela é a pessoa que mais entende da recuperação após a grande depressão. Ela é respeitada no meio acadêmico, mas com perfil de historiadora econômica. Recentemente, tentou trocar a Universidade de Berkeley por Harvard. Queria ficar mais perto dos pais e sogros. Mas a nova presidente da universidade recusou a vaga. Deve estar arrependida.
O time se completa com uma advogada, também definida como brilhante. Melody Barnes saiu de um escritório importante de NY, o Shearman & Sterling, trabalhou como assessora do Ted Kennedy e era a principal coordenadora de Pesquisa e defesa de Políticas Públicas do Center for American Progress, o think tank dos liberais mais progressistas. Uma espécie de lobby do bem. Ela será a chefe do Conselho Político do presidente.
Obama não anunciou, mas há outra peça neste quebracabeça.
Peter Orszag será o chefe do Orçamento. Já chega pedalando a bicicleta, porque era o chefe do Departamento de Orçamento no Congresso. Obama disse que vai rever todos os programas.
Orszag conhece cada um.
Obama armou bem o time, ganhar o jogo é outra coisa. A crise é grave, e ele quer recuperar a economia e reestruturála ao mesmo tempo, para entrar na fase da economia verde, de baixo carbono.
Quer criar empregos, quando eles diminuirão. Quer cortar impostos, quando a arrecadação vai cair. Será um duro começo de governo.

oglobo.com.br/miriamleitao
e-mail: miriamleitao@oglobo.com.br

COM LEONARDO ZANELLI