sábado, julho 26, 2008

Demografia: Saúde


Aos 60 com pique de 50

A vida não está apenas mais longa. Avanços médicos 
e hábitos saudáveis permitem envelhecer com saúde


Adriana Dias Lopes


Lailson Santos
A META É CHEGAR BEM AOS 80
Aos 61 anos, o advogado paulistano Francisco Fraga tem uma rotina de deixar muito adolescente sem fôlego. Além das doze horas diárias dedicadas ao trabalho, pratica exercícios físicos todos os dias, pontualmente às 6 da manhã. O treino é dividido entre partidas de tênis e sessões de musculação e aeróbica na academia. Nos fins de semana, faz caminhada. "Estou fazendo uma poupança de saúde", diz. Nesse pacote, ainda estão check-ups semestrais e alimentação saudável. "Quero chegar aos 80 com o fôlego de hoje", afirma o advogado.

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De cada 100 brasileiros que viviam na década de 20, apenas três ultrapassavam a barreira dos 60 anos. Para os que estão nascendo hoje, a probabilidade de romper essa marca é três vezes maior. E com uma vantagem enorme sobre os antepassados: não apenas se vive mais, mas com qualidade. O primeiro passo para uma vida longeva foi dado com o controle das doenças infecto-contagiosas e com o investimento em saneamento básico, na primeira metade do século XX, o que reduziu drasticamente o número de mortes precoces. Desde o início do século passado, a expectativa de vida deu um salto de 120%: passou de 33 para quase 73 anos. Mas a meta ideal não se restringe a ultrapassar os limites da idade. É preciso ter saúde e disposição para desfrutar a segunda metade da vida. O envelhecimento em boa forma física e mental só se tornou possível com o controle, sobretudo nas últimas duas décadas, dos males que mais afetam os idosos: as doenças crônicas, dentre as quais as mais comuns são diabetes, hipertensão, osteoporose, câncer e depressão. "Hoje, quem mantém uma doença crônica bem-cuidada e sob controle pode ter a mesma qualidade de vida de quem não é doente", diz Wilson Jacob Filho, professor de geriatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Atualmente, as patologias crônicas são responsáveis por 40% de todas as doenças no mundo, e acredita-se que, em 2020, elas responderão por 60% do total de moléstias dos países em desenvolvimento.

O brasileiro dos grandes centros urbanos que chega aos 60 anos sem uma doença grave tem pela frente pelo menos mais quinze anos de vida saudável. Se ele vencer a marca dos 70, poderá contar com mais dez anos bem vividos. "O controle médico das patologias crônicas simboliza um dos maiores saltos evolutivos da humanidade", afirma o geriatra Fábio Nasri, do Hospital Albert Einstein, de São Paulo. O advogado paulistano Francisco Fraga, de 61 anos, tem como meta chegar aos 80 com o mesmo fôlego de hoje. Para compensar a rotina de doze horas diárias no escritório, tem feito, como ele diz, uma "poupança de saúde". Submete-se a check-ups semestrais, não fuma e pratica exercícios físicos todos os dias para controlar o colesterol alto. "Meu pai infartou aos 68 anos. Pretendo ir muito além e esbanjando saúde", declara. Há pelo menos quatro fatores-chave que garantiram a Francisco – e aos outros 19 milhões de brasileiros que passaram dos 60 anos – uma vida não apenas longa, mas saudável.

Exames preventivos – A partir da década de 80, com o aprimoramento dos métodos diagnósticos, o check-up tornou-se um procedimento corriqueiro. A procura pelos exames anuais em hospitais particulares do país cresce, em média, 10% ao ano. Uma bateria de exames bem-feita, além de detectar doenças precocemente, ajuda o paciente a adotar um estilo de vida mais saudável. As versões mais modernas de tomógrafos e aparelhos de ressonância magnética, desenvolvidas na última década, permitem a descoberta de uma enfermidade anos antes do surgimento de seus primeiros sintomas. Uma tomografia é capaz de localizar nas artérias o depósito de placas de cálcio de menos de 1 milímetro cúbico ou tumores de até meio milímetro, quando as chances de cura e controle da doença são maiores.

Tratamentos mais eficazes – Por ser mais preciso e seguro, o arsenal terapêutico contra as doenças crônicas pode ser administrado, em sua maioria, por tempo ilimitado, com menos efeitos colaterais. Um exemplo são as estatinas: lançadas em meados da década de 80, elas revolucionaram a prevenção e o tratamento do colesterol alto, um dos piores inimigos do coração. Podem ser tomadas pela vida toda. Até mesmo remédios como os quimioterápicos já são mais bem tolerados. Por estarem menos tóxicos, hoje esses medicamentos são acessíveis a pacientes com mais de 70 anos. Para grande parte dos diabéticos tipo 2, basta uma picada por dia de insulina para o controle da doença. Nos anos 30, era necessário reaplicar a dose de hormônio a cada quatro horas.

Acesso a planos de saúde – Os brasileiros com mais de 60 anos representam 11% do total de usuários de planos de saúde: são 4,5 milhões de pessoas. Convênios médicos facilitam o acesso não só a hospitais e profissionais de ponta, mas a programas de saúde preventivos. A prática é bastante estimulada por planos empresariais – hoje, 40% dos convênios médicos são bancados pelos empregadores. Na conta dos empresários, sai mais barato investir na prevenção do que no tratamento das doenças de seus funcionários. O custo de um obeso às empresas, por exemplo, é cerca de 10% maior. Os gastos se devem a faltas ao trabalho e a despesas com o tratamento de moléstias associadas ao excesso de peso – distúrbios cardiovasculares, diabetes tipo 2, hipertensão e colesterol alto.

Adoção de hábitos saudáveis – Hoje já se sabe que, na equação da boa saúde, 70% cabem ao estilo de vida. Os outros 30% são determinados pela genética. Uma pesquisa inglesa, divulgada no início deste ano por médicos da Universidade de Cambridge, revelou que hábitos saudáveis podem acrescentar catorze anos à vida de uma pessoa. Isso inclui não fumar, consumir cinco porções de fruta por dia, praticar exercícios físicos – ao menos meia hora diária de caminhada, natação ou bicicleta – e ingerir moderadamente bebidas alcoólicas. O ideal são duas taças de vinho ou uma dose de uísque ou duas latinhas de cerveja por dia. Não há avanço médico que dê conta dos efeitos perversos do fumo, do sedentarismo e da alimentação fora de controle. Em outras palavras, de nada adianta tomar um super-remédio que reduza drasticamente as taxas do colesterol ruim no sangue sem fazer dieta e sem abandonar as comidas gordurosas. A medicina faz a sua parte. Chegar lá – e bem – depende de cada um.