domingo, setembro 30, 2007

Alberto Tamer

Com petróleo a US$ 83, etanol é inevitável


E agora? O preço do barril de petróleo passou de US$ 83 na sexta-feira, um aumento de mais de 36% só neste ano. A tendência é de alta e tudo indica que o piso de US$ 80 parece ter vindo para ficar. E agora? Agora é que, para livrar-se da dependência perigosa do petróleo que mantém o mundo refém da Opep, não há outra saída senão o uso intensivo de etanol e outros biocombustíveis. Tudo o mais são teses engenhosas mas insustentáveis.

GASOLINA É SÓ 45%

Há, sem dúvida, uma campanha contra o bicombustível, alimentada pelos produtores e pelas companhias de petróleo.

A única exceção altamente louvável é a da Petrobrás, que aderiu ao etanol e está investindo pesadamente na construção de alcoodutos para atender o mercado interno e exportar. Ela sabe que o álcool substitui apenas um derivado do petróleo, a gasolina, e ela representa, em média, variando com o tipo de petróleo, cerca de 45% de um barril quando refinado.

Sei que os países da Opep têm muito a perder com os biocombustíveis, mas continuarão ainda lucrando muito com um preço que eles querem nos impor de US$ 85 e - por que não? - até US$ 100 o barril, que os especialistas prevêem para os próximos anos. Afinal, extraem a um custo irrisório de US$ 14 em média. Um lucro fantástico! E o resto do mundo que se dane.

MAS NÃO HÁ INFLAÇÃO!

Sim, a explosão do preço do petróleo ainda não está pressionando a inflação - afinal é coisa de alguns meses -, mas isso só nos países desenvolvidos, onde é alto índice de produtividade. EUA, Europa e Japão podem resistir ainda um pouco, mas os países menos desenvolvidos, os emergentes, como o Brasil, não! Aí está a inflação na China a 6,5% ao ano, a Índia, a Indonésia e o Paquistão, 6,5%, o Brasil apontando para 4%. Os ricos agüentam. Os menos desenvolvidos, não. E nem estou falando dos miseráveis da África e de alguns países asiáticos, que simplesmente se afundam ainda mais no drama da sua miséria.

O DILEMA QUE NÃO EXISTE

E aqui, surge o dilema que não existe entre etanol, o biodiesel e alimento. A cana está roubando áreas para plantio de grãos! Em conseqüência, os preços dos alimentos sobem vertiginosamente sem limite! É o que falsamente proclamam os arautos da fome, agora escorados em relatório nada convincentes da ONU. É mentira! Pura mentida. O que está causando uma alta de 40% nos preços do commodities agrícolas não é a queda na produção, que, ao contrário, aumentou, mas o aumento exacerbado do consumo.

E aqui se desfaz o dilema: etanol ou alimento. A corrida por comida surgiu nos últimos anos porque entraram e ainda estão entrando no mercado cerca de 3 bilhões de novos consumidores beneficiados pela melhoria dos padrões de vidas provocada por um longo e raro período de mais de seis anos de crescimento econômico. É praticamente a metade da população mundial! Alan Greenspan, ele mesmo, ressalta o fato, relegado por muitos a um segundo plano, ao afirmar que este afluxo ao mercado está mudando o cenário da economia mundial. E, neste cenário, o petróleo a US$ 80 é um verdugo e o etanol a US$ 35, uma salvação.

TODOS OS PREÇOS EM ALTA

Mas os arautos da fome não se cansam, e apontam, com o dedo em riste: ''''O biodisel é o culpado!'''' Uma análise das estatísticas sobre o custo das commodities nos últimos 12 meses mostra que as commodities agrícolas tiveram uma alta de 40%, sim, mas aqueles senhores se esquecem de que a nafta, refinada do petróleo, teve um aumento expressivo de 16,2% e os fertilizantes intensamente utilizados na agricultura também se originam do petróleo, esse mesmo a mais de US$ 80. É fácil imaginar quanto esse aumento pesou no custo da produção agrícola. E, mesmo assim, o etanol de cana permaneceu estável em US$ 35.

Se os preços das commodities industriais e minerais não se fizeram sentir até agora na inflação é porque seu efeito só virá mais tarde, no decorrer de meses, embutidos em outros produtos; ao contrário, o impacto da alta dos alimentos pesa imediatamente sobre o custo de vida, no consumo de cada dia.

Mas ninguém quis lembrar disso nas suas críticas ao biodisel. Ele é o culpado! Para que lembrar aqueles fatos? Vamos esconde-los, pois enfraquecem os nossos argumentos de acusação.

HÁ DISTORÇÕES... DELES

Há também distorções que levam a conclusões erradas. Por exemplo, o governo americano continua estimulando o plantio de milho para produzir etanol, um absurdo, pois o custo é US$ 65 enquanto o do etanol de cana não passa de US$ 35. E, para proteger seus agricultores, ele impõe uma tarifa de US$ 0,45 sobre etanol importado. Com isso, num sinal de estultice monumental, eleva os preços pagos pelo consumidor interno.

Isso até passaria se se concentrasse em aumentar o preço do etanol importado. Mas, não. O governo americano subsidia também fortemente a produção de milho destinado a produzia etanol, gasta mais de U$ 4 bilhões por ano (!) e, com isso, desvia o agricultor da produção de grãos para alimentação.

É lógico que os preços de todos os alimentos sobem! E ele ainda vem acusar o etanol de roubar terras da agricultura de grãos e provocar o aumento dos preços dos alimentos! Mas, olha aí senhores, a culpa é de vocês, não é nossa!!!

HÁ MUITA TERRA, SIM

Há ainda áreas imensas e mal exploradas para cultivar, há montanhas enormes de grãos estocados, há toneladas de leite em pó sobrando. É alimento à espera de consumo. Não falta nem faltará comida no mundo se esses estoques ociosos puderem ser consumidos. Sei que, quanto mais aumentar o consumo, mais aumentarão também os preços.

Mas há uma solução para esse falso dilema: que os países ricos desenvolvam um trabalho de apoio aos mais pobres para que eles produzam mais e melhor; o aumento da renda dos agricultores beneficiados compensará em muito o reajuste dos preços dos produtos que eles passarão a consumir. E, assim, se alcançará a meta da ONU, de combate à pobreza. Ela deveria ser a primeira a defender os biocombustíveis, pois eles criam empregos, geram renda e afastam a necessidade da esmola improdutiva como caridade contra a fome.