terça-feira, março 27, 2007

Merval Pereira - Pulseira de segurança




O Globo
27/3/2007

A explosão de crescimento da percepção, pela população brasileira, de que a segurança se tornou o principal problema nacional, revelada pela pesquisa Datafolha, colocou a questão irreversivelmente no foco político da oposição, ainda mais que a popularidade do presidente Lula, embora continue em altos patamares, teve uma queda no mesmo período em que a segurança superou o desemprego nas preocupações da população. Frases como "a violência às vezes é questão de sobrevivência", ou a ênfase nos programas sociais como solução de longo prazo, sem que, no imediato, a questão da violência seja combatida com rigor, podem estar fazendo com que o governo Lula se dissocie do sentimento da sociedade.

Dois potenciais candidatos oposicionistas à sucessão já estão se posicionando. O governador de Minas, Aécio Neves, em visita à Colômbia, criticou o governo federal por não assumir como tarefa de segurança nacional o combate ao narcotráfico, como sugeriu o presidente colombiano Álvaro Uribe, para irritação dos governistas.

Já o governador José Serra vai assumir uma posição de vanguarda na prevenção ao crime, instituindo o controle eletrônico de todos os presos que estiverem em regime aberto ou em liberdade condicional no Estado de São Paulo.

Essa maneira de o Estado exercer o controle desse tipo de preso, que está em estudo pelo Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, já é realidade em países como os Estados Unidos, França, Portugal, Espanha e Inglaterra, e funciona por meio de um transmissor adaptado em uma pulseira ou tornozeleira, que envia para um banco de dados a localização exata do preso fora do presídio.

Não há proibição na Lei de Execuções Penais, e bastará que a Secretaria de Administração Penitenciária de São Paulo coloque à disposição da Vara de Execuções Penais esse tipo de acompanhamento dos presos. Alguns países, como Portugal, utilizam o sistema para compensar um problema que no Brasil é explosivo: a superlotação carcerária.

Esse é um projeto que vem sendo pensado desde o governo Fernando Henrique, quando o então ministro da Justiça, José Carlos Dias, defendia que apenas os presos perigosos ficassem nas prisões.

As estatísticas do Sistema Integrado de População Carcerária revelaram o que já era pressentido: embora disponha de 242 mil vagas, o sistema prisional brasileiro tem 401 mil presos. A construção de novas prisões custa, em média, cerca de R$25 mil por vaga. Em termos de manutenção, cada preso custa, em média, cerca de R$1 mil por mês aos cofres públicos.

Anteriormente, José Serra já havia anunciado um programa de saúde da mulher que inclui medidas de planejamento familiar, como a distribuição de anticoncepcionais e das chamadas "pílulas do dia seguinte".

Serra está disposto também a conversar com o prefeito de Porto Alegre, José Fogaça, do PPS, para se informar sobre um programa da secretaria municipal de Saúde que implantou contraceptivos hormonais com a duração de três anos em jovens de 15 a 18 anos, para combater a gravidez precoce. Esse programa, no entanto, está suspenso depois de ter sido acusado por movimentos sociais, entre outras coisas, de "violar os direitos reprodutivos das jovens".

Da mesma forma, Serra está preparado para uma reação contra o uso das pulseiras, mas acha que deve tomar a iniciativa para discutir medidas concretas de combate à violência. Certamente haverá reação de diversos grupos ligados aos direitos dos presos, alegando que eles serão submetidos a constrangimentos ao usar a pulseira ou a tornozeleira, que os identificará como condenados.

José Serra não foi à Colômbia com os governadores de Minas, Aécio Neves, e do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, mas conhece bem, de viagens anteriores, as medidas lá adotadas. Para demonstrar a diferença de atitude diante dos problemas, Serra ressalta que lá a prefeitura é responsabilizada judicialmente por permitir crianças abandonadas perambulando perlas ruas, enquanto aqui a autoridade que quiser tirar menores das ruas é acusada por diversas ONGs de, no mínimo, impedir o direito de elas estarem nas ruas.

Serra considera também que o governo federal não trata com rigor as companhias telefônicas que não conseguem bloquear os celulares nas prisões alegando falta de condições técnicas. O governador paulista acha que a Anatel, como todas as agências reguladoras, foi esvaziada pelo governo e perdeu sua força de pressão sobre as operadoras.

Para Serra, o governo federal deveria obrigar as companhias telefônicas a se consorciarem para prestar o serviço de bloqueio em todas as prisões para os diversos tipos de aparelhos, e dividir entre si o custo, barateando assim a operação.

Todas essas atitudes diante das questões da segurança e correlatas são necessárias, diz Serra, mas o que resolve mesmo é a criação de empregos. Por isso, espantou-se quando ouviu o presidente Lula afirmar, na posse de três novos ministros na última semana, que o crescimento do PIB com o decréscimo de investimento se devia "à quantidade extraordinária de dinheiro colocado nas políticas sociais deste país".

Na véspera, o IBGE havia divulgado que cerca de 2,04 milhões de pessoas estavam desempregadas nas seis principais regiões metropolitanas do país no mês de janeiro, com a taxa de desemprego subindo para 9,2%. Para Serra, está demonstrado que a ênfase nos programas sociais, por si só, não cria as condições de uma mudança estrutural na vida dos pobres. Somente a oferta de emprego, e o crescimento econômico baseado na produção de riqueza, é que pode levar a um estado de bem-estar social sustentado.