quarta-feira, setembro 27, 2006

LIÇÕES GAÚCHAS

LIÇÕES GAÚCHAS
por Denis Rosenfield, filósofo

Particularmente interessantes são os dados de uma pesquisa, relativa ao Rio Grande do Sul, publicada pelo jornal Correio do Povo. Assinale-se que esse jornal tem um instituto de pesquisa de opinião altamente confiável e de maior credibilidade do que o Ibope nesse estado. A sua credibilidade se deve ao fato de ter acertado muito mais do que o Ibope nas últimas eleições. Não se trata, pois, de um instituto qualquer. Os seus dados são os seguintes: Alckmin 43.2 %, Lula 29.8%, Heloísa Helena, 11.5%, outros 1,7%. Lula 29,8%, demais 56,4%. Ora, esses números mostram, principalmente, a queda do PT naquele que foi, durante muitos anos, o seu mais importante reduto. O berço do partido, pode-se dizer.

A experiência gaúcha, nas últimas eleições, tem mostrado que o PT vem perdendo progressivamente força. Perdeu o governo do Estado e, depois, as mais importantes cidades, inclusive a capital Porto Alegre, considerada, até então, uma fortaleza inexpugnável. Os rasgos de autoritarismo demonstrados, a perseguição a jornalistas, a perda de respeitabilidade moral, o início de escândalos, a expulsão da Ford, o apoio ao MST, o desrespeito ao estado de direito, o aparelhamento da Brigada Militar, a destruição do relógio que comemorava o descobrimento do país e tantos outros fatos foram minando progressivamente a credibilidade do partido. Criou-se, no estado, uma forte opinião pública não-petista, anti-petista, que passou a prezar, antes de tudo, a liberdade, o respeito ao estado de direito e a aposta no desenvolvimento.

Neste quadro, é surpreendente a dissintonia entre o avanço de Alckmin e a suposta neutralidade de políticos como Germano Rigotto, Pedro Simon e José Fogaça, respectivamente, governador, senador e prefeito de Porto Alegre. Em nome de interesses menores, que certamente não os engrandece, preferiram não se manifestar publicamente sobre as eleições presidenciais. Chegamos ao cúmulo da situação em que terão, na verdade, de ficar calados frente ao dossiê-Cuiabá, que mostra, novamente, em operação a “organização criminosa” que tomou conta do Estado brasileiro. Se falarem, não deixarão de ser contraditórios com o que fazem no estado. Ficaram não apenas aquém do que seriam políticos com P maiúsculo, mas aquém de seus próprios eleitores, que dizem não ao candidato petista à presidência da República. As suas próprias opiniões se tornaram irrelevantes aos olhos de uma sociedade que viveu a experiência petista de governar.

No estado, a mesma pesquisa Correio do Povo mostra que Olívio Dutra, candidato petista, não está disputando o primeiro lugar, mas o segundo. A sua diferença em relação à candidata Yeda Crucius é de apenas 3 pontos percentuais. O PT cai em relação à sua média histórica no estado, arriscando não estar presente no segundo turno, situação impensável há poucos anos atrás. Processo semelhante passa a ameaçar o candidato ao senado, o ex-ministro Miguel Rossetto, que está tendo uma pífia votação em relação ao que era o PT gaúcho de antanho. O crescimento de Mônica Leal, do PP, mostra o quanto a credibilidade do partido caiu. O Senador Simon está com sua reeleição garantida. Logo, no nível estadual se coloca a mesma questão que pauta a eleição federal. Esse fenômeno expõe, entre outras coisas, que candidatos que se posicionam contra o PT, portadores de um nome próprio, comprometidos com a ética e o estado de direito, têm condições de verem prosperar as suas candidaturas. Partem de um enorme capital de confiança. Talvez essa lição não tenha sido bem compreendida pelos ganhadores das eleições passadas que creditam demais às suas próprias virtudes as suas respectivas vitórias. É esse equívoco que os faz tomar uma posição dita de neutralidade, que não se coaduna com a tradição do estado, feita por homens e mulheres que assumem publicamente posições políticas e não recuam diante do confronto.

Por último, a queda livre do ex-governador Collares exibe o quanto o trabalhismo está numa crise profunda. Em seu berço também, perde força e desaparece como alternativa de poder. Os seus ínfimos percentuais de intenção de voto mostram o quanto as suas políticas oscilantes e contraditórias dos últimos anos terminaram por afetar o seu próprio eleitorado. Ora o partido namorava com o PT, ora dele se distanciava. Em todo caso, a dubiedade tem caracterizado a sua trajetória nas últimas eleições. Triste destino para um partido cujo programa, no antigo PTB, foi escrito por Arlindo Pasqualini. Tratava-se de um programa partidário, extremamente bem elaborado, que não ficava nada a dever aos seus congêneres da época, o trabalhismo inglês e a social-democracia alemã. Hoje, está igualmente esquecido.