sábado, julho 29, 2006

VEJA O pacote do governo para segurar o real

O real virou turista

Barrada por décadas, a moeda
brasileira vai ser aceita nas compras
nos free shops dos aeroportos do país


Carlos Rydlewski e Chrystiane Silva

O governo federal autorizou na semana passada que os 29 free shops instalados em nove aeroportos brasileiros vendam seus produtos não apenas em dólares ou euros, mas também em reais. A mudança corrige uma antiga distorção: o Brasil deixa de ser um dos poucos países que não permitem o uso de sua moeda nas compras de artigos importados nesses estabelecimentos. Essa restrição tem origem na lógica que norteou a criação dos free shops no país, no fim dos anos 70. Naquele tempo havia escassez de divisas e o governo queria segurar por aqui parte dos dólares que os viajantes brasileiros torravam em compras no exterior. Hoje, tal estratégia não faz mais sentido. A permissão para as transações em reais entra em vigor assim que a medida for publicada no Diário Oficial, o que deve ocorrer ainda em agosto.

A nova legislação autoriza que o pagamento em reais seja feito em dinheiro vivo, cartões de crédito ou cheques. Mas as lojas, situadas em áreas com acesso restrito a passageiros de viagens internacionais, não serão obrigadas a aceitar todos esses meios. Nas compras em reais realizadas com cartão de crédito, o viajante terá uma vantagem imediata. Atualmente, as transações desse tipo feitas em dólares pagam o imposto sobre operações financeiras (IOF) de 2%. Com o uso de reais no cartão, o tributo não será cobrado. O consumidor também se livra das variações cambiais que podem ocorrer entre a compra com cartão e o vencimento da fatura em dólar. É preciso, porém, ficar de olho na cotação que será utilizada para o câmbio, pois, na prática, ela será definida pelos free shops.

O primeiro ponto-de-venda desse tipo em aeroportos surgiu informalmente na década de 50, em Shannon, próximo a Limerick, cidade no oeste da Irlanda. Comerciantes aproveitaram que a região já era considerada livre de impostos e passaram a vender bebidas e cigarros aos passageiros sem pagar tributos de importação, enquanto os aviões eram abastecidos. Hoje, os artigos de luxo estão no topo da lista de vendas de free shops, seguidos por perfumes e bebidas. As lojas mais movimentadas ficam nos aeroportos de Heathrow, em Londres, Seul, na Coréia do Sul, e Dubai, nos Emirados Árabes – onde se concentram os itens mais caros à venda no planeta. Nos aeroportos brasileiros, onde 12,6 milhões de pessoas entraram e saíram do país em 2005, os free shops são explorados praticamente por uma só empresa: a Dufry, que acumula 28 das 29 lojas existentes e faturou 220 milhões de dólares com esses estabelecimentos em 2005. "Talvez, num primeiro momento, o impacto das vendas em reais não seja grande na nossa receita, mas a nova medida facilitará a vida dos turistas", diz Humberto Mota, presidente da Dufry do Brasil. De acordo com estimativa do Generation Group, empresa sueca especializada nesse ramo, em todo o mundo, neste ano, os viajantes devem gastar 28 bilhões de dólares nos pontos-de-venda duty-free (livre de impostos). Em 2005, as vendas somaram 26,7 bilhões de dólares. Mais da metade do valor foi gasto nas lojas de aeroportos. O restante, em navios ou em transações promovidas por companhias aéreas em vôos.

A adoção do real nos free shops brasileiros foi incluída num pacote de medidas que mudou a legislação sobre as operações de câmbio no país. A principal alteração teve como alvo os exportadores. Eles poderão deixar no exterior até 30% dos dólares que recebem como pagamento pelas mercadorias vendidas. Isso para pagar dívidas contraídas lá fora. Hoje, 100% do dinheiro recebido com as exportações é obrigado a entrar no Brasil e ser convertido em reais no prazo de 210 dias. Depois, é novamente transformado em dólares para o pagamento dos débitos no exterior. Sobre essa operação incide a contribuição provisória sobre movimentação financeira (CPMF).

O que muda nos caixas duty-free

MOEDA

Como era: os pagamentos nas lojas eram feitos apenas em moedas estrangeiras conversíveis, como dólar e euro

Como fica: as compras poderão ser feitas também em reais. Isso inclui o uso de dinheiro, cartão de crédito e cheque

LIMITE

Como era: 500 dólares

Como fica: 500 dólares. Nas compras em reais, o limite será calculado por uma taxa de conversão com base no dólar definida pelas lojas