domingo, julho 30, 2006

DORA KRAMER O império contra-ataca








ESTADO

Governo fará pacote contra fraude no Orçamento para evitar desgaste da CPI

Dora Kramer

Ainda não é oficial, mas petistas de primeiro escalão já conversam abertamente sobre um pacote de medidas que o governo está preparando para anunciar nos próximos dias, contra fraudes no Orçamento e para instituir mecanismos mais rígidos de controle no Executivo, para fiscalização do uso do dinheiro.

O objetivo é rivalizar em impacto com os trabalhos da CPI dos Sanguessugas e, sobretudo, tentar neutralizar a repercussão das novas descobertas que trazem à cena nomes de gente importante ligada ao governo.

O sinal de alerta foi aceso com a divulgação do envolvimento do ex-presidente do PT do Ceará José Cyrilo na liberação de um pagamento devido à Planam (empresa-mãe das operações dos "sanguessugas") em favor do qual ele teria intercedido com o então ministro da Saúde, Humberto Costa, agora candidato do PT ao governo de Pernambuco.

O receio do governo é de que a CPI de agora reponha no cenário da campanha o tema dos escândalos de corrupção que, avaliava-se no governo, já havia contabilizado todos os prejuízos possíveis e não estaria no centro do debate e das cobranças dos adversários, muito menos do eleitorado.

Mas o inesperado aconteceu: a CPI, nascida desacreditada, "pegou" e estendeu-se para além do Congresso. Quando percebeu que a "coisa começava a virar contra o governo" - na expressão de atuante ministro -, o Planalto iniciou a reação: auxiliares e o próprio presidente da República, até então espectadores de camarote das agruras dos parlamentares investigados, saíram a campo para "lembrar" que a Operação Sanguessuga foi um trabalho da Polícia Federal com origem em suspeitas levantadas pela Controladoria-Geral da União.

Mas deixaram de lado o fato de que, nesse meio tempo, houve a atuação do Ministério Público e da Justiça de Mato Grosso, culminando com a CPI dos Sanguessugas - considerada no início um "factóide" pela liderança governista na Câmara e sabotada pela cúpula do Congresso, estes sim fatores decisivos para as descobertas e sua divulgação ao público.

Detectado o potencial do prejuízo, veio o contra-ataque, cuja ação mais forte será o pacote de medidas saneadoras, entre as quais deve estar uma proposta de extinção das emendas individuais, sendo permitidas apenas as emendas coletivas, de bancada.

Com isso, o governo tentará tirar a bandeira do saneamento ético das mãos da CPI dos Sanguessugas e assumir a posição de grande reformador. Louvável a atitude, mas um pouco subtraída em suas boas intenções por ter sido tomada em função da CPI.

A comissão, óbvio, saudará com entusiasmo as medidas, mas está atenta para que não sejam vistas como um substituto para a CPI, cujos trabalhos prosseguirão até o fim do ano a despeito do risco da politização por causa das eleições.

E por que continuar os trabalhos, mesmo tendo dezenas de parlamentares denunciados e providências de correção de rumos já tomadas?

Porque, no entendimento daquele grupo que instalou a CPI na marra, o aprofundamento da crise de credibilidade moral do Congresso é a única chance de o eleitorado despertar para a necessidade de uma renovação de qualidade a partir das eleições.

Não adianta, na visão de deputados como Fernando Gabeira, Raul Jungmann e Antônio Carlos Biscaia, recuar e se dar por satisfeito com a denúncia de 80, 90, ou 100 deputados sem contar a história completa e até o fim, porque é fundamental que todos - eleitores, partidos, candidatos, governo e oposição - fiquem imbuídos do espírito de que como está não dá mais para continuar.

Se as coisas forem feitas pela metade, de maneira a dar uma satisfação à opinião pública e nada mais, a renovação, mesmo sendo alta, por si só não garantirá a moralização do Parlamento, ou de pelo menos boa parte dele.

O aprofundamento da crise nesse sentido é considerado didático, por romper a inércia e propiciar um ambiente de ruptura com a velha e viciada ordem, fugindo da dinâmica da crise permanente, onde um escândalo é sempre um "remake" do anterior.

Melhor com ele
A CPI dos Sanguessugas viveu uma semana de tensões. No momento mais crítico, o relator Amir Lando chegou a perguntar aos colegas, que enxergavam nele intenções de "esfriamento" dos trabalhos por pressão de seu partido, o PMDB, se queriam sua renúncia.

Apesar das críticas, acharam melhor não, pois, na avaliação deles, o senador de Rondônia, candidato ao governo do Estado, ainda é mais razoável que qualquer eventual substituto indicado pelo PMDB governista, em virtude de ainda manter relações amistosas com a própria biografia.

Isonomia

Se os atuais investigados pela CPI dos Sanguessugas que forem reeleitos podem ter seus casos julgados na próxima legislatura com base na jurisprudência Pinheiro Landim - que renunciou, foi reeleito e cassado na retomada do processo -, os "renunciantes" da crise do mensalão candidatos à reeleição correm o mesmo risco.

Caso as urnas não façam justiça, a questão será levantada.