sábado, fevereiro 25, 2006

Miriam Leitão Nós e os outros

Nós e os outros

O Brasil e o mundo estão dançando em ritmos diferentes. Ontem, véspera de carnaval, isso ficou claro. O mundo está indo mais rápido do que o Brasil. O nosso crescimento de apenas 2,3% fica parecendo câmera lenta perto do mundo. Somos diferentes também em inflação e em juros real. Até no risco, apesar da queda recente, o Brasil está num nível maior do que outros emergentes, acima, inclusive, de países como a Turquia, que tem déficit em transações correntes.

O ano passado foi um fiasco. O Brasil cresceu só um pouco mais do que o 1,9% de 2002, lembrando que 2002 foi um ano de crise e que não recebeu qualquer carregamento estatístico do ano anterior. Em 2005, pelo menos 1,5% já estava garantido por herança estatística do ano de 2004, em que o crescimento foi quase 5%.

Comemorar avanços é bom e até alivia o coração do brasileiro sempre aflito com tantas crises econômicas, mas a verdade agora é que as más notícias são ruins mesmo e as boas não são tão boas quanto as de outros países.

O Brasil cresceu menos que a média dos emergentes e do resto do mundo. O desempenho é igual ao do Japão, país com crônica incapacidade de crescer. Se analisarmos uma década, de 1999 a 2006, olhando as expectativas deste ano, fica claro que o Brasil só teve um desempenho comparado com o mundo em 2000 e 2004 (veja gráfico).

Na inflação, também a trajetória do Brasil mostra que o nosso passo está errado. Os emergentes já estavam em 4%, em média, em 2002 quando o Brasil voltou aos dois dígitos pela dúvida em relação à política antiinflacionária de Lula. Os dados mostram que estamos convergindo para o nível mundial, mas depois de muitos anos de esforço, como mostra o gráfico.

A taxa de risco Brasil medida pela aceitação dos papéis brasileiros no exterior, segundo cálculo do JPMorgan, caiu de forma impressionante. Só este ano, a queda foi de 83 pontos percentuais, estando agora em 221. Mas o risco país é maior que o dos emergentes. O México está abaixo dos 100 pontos, em 99. Maior até que o da Turquia, país que tem uma situação macroeconômica muito pior que a do Brasil. Para se ter uma idéia, este será o quarto ano em que o Brasil tem superávit em transações correntes e a Turquia tem um rombo de 5% do PIB.

Somos diferentes também em taxas de juros. Os nossos são muito, mas muito, maiores do que os deles. Uma das razões dos juros altos está respondida no segundo gráfico. O Brasil tem uma inflação mais alta e que foi derrubada com muita dificuldade. Por outro lado, tem um déficit nominal (que inclui as despesas com juros) do tamanho do de países europeus. O déficit nominal aumentou no ano passado, saindo de 2,7% para perto de 3,3%. Ficou assim no nível da Itália. É muito, mas o nosso é deste tamanho apesar de este ser o oitavo ano de superávit primário.

Nossa carga tributária também é maior do que a de muitos países emergentes, vizinhos ou não. O aumento da carga tributária tem sido constante nos últimos anos. De 1999 a 2005 ela saiu de 31,1% para uma estimativa de 37% no ano passado.

Olhar para os lados, para o desempenho de outros países, deixa claro que o Brasil tem vários passos a acertar. Precisa diminuir o custo do governo, reduzir a carga tributária, manter inflação mais baixa, reduzir muito os juros e, assim, crescer mais.


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