sábado, janeiro 28, 2006

VEJA CPI Depoimento de Palocci foi pífio

Palocci irreconhecível

O Congresso chamou o ministro,
mas quem se apresentou foi o prefeito.
Antonio Palocci fez sua pior aparição
pública na semana passada


Julia Duailibi

Sérgio Lima/Folha Imagem

O ministro Antonio Palocci: sucesso na condução da economia versus os fantasmas do passado

O ministro Antonio Palocci se preparou durante três meses para depor na CPI dos Bingos. Alvo de múltiplas acusações – que começam por corrupção em sua gestão como prefeito de Ribeirão Preto, passam pela arrecadação clandestina de dinheiro durante a campanha de Lula e terminam com fortes indícios de tráfico de influência com a participação de antigos e de atuais assessores da Fazenda –, Palocci mostrou que ainda está preso ao passado. Em quase seis horas de depoimento, o ministro não foi capaz de esclarecer nenhuma das acusações feitas contra ele. Pior que isso: foi chamado de mentiroso, desafiado, confrontado e, com um comportamento quase monástico, muito próximo da passividade, se recusou a criticar seus detratores quando questionado se os processaria. Depois de várias sessões de ensaio com assessores especialmente contratados para treiná-lo, Palocci estava preparado para responder à maioria das perguntas dos parlamentares. Negou a existência das irregularidades mais do que evidentes em sua gestão em Ribeirão Preto, classificou como fantasiosa a operação para trazer dólares cubanos para a campanha de Lula e tentou manter uma inacreditável distância dos antigos amigos e assessores envolvidos nos escândalos.

Dessa vez a mágica não funcionou, apesar de encontrar na CPI um ambiente sem hostilidade, com uma parte da oposição se derretendo em elogios à política econômica do governo. Constrangido, Palocci teve de ouvir um sermão do senador Jefferson Peres, do PDT: "Quando se ocupa um cargo importante é preciso repetir o ditado da mulher de César e não apenas ser honesto, mas parecer honesto". Foi chamado de mentiroso pela senadora Heloísa Helena, que chegou a insinuar ter uma testemunha capaz de desmascará-lo: "Estou convencida de que o senhor está mentindo o tempo todo". Foi advertido pelo senador Demostenes Torres, do PFL, de que não passava de blefe a afirmação de que processaria seus detratores somente depois de encerradas as investigações, já que, segundo o senador, que também é promotor público, os crimes prescreveriam. Palocci foi ainda instado pelo tucano Antero Paes de Barros a disponibilizar voluntariamente seu sigilo telefônico para a CPI confirmar se realmente ele se afastou de antigos assessores de Ribeirão Preto. Inseguro, o ministro disse apenas que iria analisar a proposta. Diante do bombardeio, Palocci ainda tentou se defender afirmando que ninguém – ele incluído – está acima de qualquer suspeita. Esteve irreconhecível.

A convicção do ministro ao tratar de assuntos econômicos deu lugar à fragilidade quando o tema envolve os fantasmas de seu passado. Palocci negou que mantivesse relações com Vladimir Poleto, que na prefeitura de Ribeirão ocupou o cargo de chefe do controle interno e admitiu ter transportado de avião 1,4 milhão de dólares oriundos de Cuba para a campanha do presidente Lula. Para demonstrar distância dos personagens envolvidos no caso dos dólares cubanos, Palocci também negou ter usado, já como ministro, um jatinho emprestado pelo empresário Roberto Colnaghi – que, em 2002, cedeu o avião para transportar o dinheiro cubano. O ministro disse que foi o PT que alugou o jatinho e que ele nem sequer sabia a quem pertencia. O senador Jefferson Peres lembrou que, em depoimento, Colnaghi não só confirmou que emprestou o avião, mas também que viajou ao lado do ministro. Palocci ainda negou ter se encontrado em Madri, em 2003, com Roberto Carlos Kurzweil, empresário que alugou para o PT o carro blindado usado para retirar os dólares do aeroporto. Kurzweil desmente o ministro. Ele confirmou a VEJA o encontro, ocorrido, segundo seu relato, no saguão do hotel Ritz. O prefeito Palocci e o Palocci coordenador da campanha de Lula apequenaram o ministro.