terça-feira, dezembro 27, 2005

Editorial da Folha de S Paulo

PREJUÍZO PETISTA
Num país onde o eleitor sempre foi convidado a votar antes em pessoas do que em partidos, o PT despontou há alguns anos como um caso raro e auspicioso de legenda que conseguia atrair a fidelidade de parte do eleitorado. Em que pese a evidência de que muitas de suas teses eram ultrapassadas ou simplesmente irresponsáveis, o fato de uma agremiação impor-se como porta-voz de um conjunto coerente de propostas constituiu uma saudável novidade num sistema político marcado pelo personalismo, pelo clientelismo e pelos interesses fisiológicos.
Hoje, no entanto, depois de ter adotado o realismo da política "tradicional", montando esquemas de desvio de verbas e costurando alianças com partidos de aluguel (alugando-os, efetivamente, por meio de "mensalões"), o PT perdeu as características que o distinguiam das demais agremiações. O partido que se apresentava como ético e coerente revelou-se um viveiro de falcatruas e ambições eleitorais.
O resultado está sendo contabilizado pelas pesquisas de opinião. Segundo o Datafolha, a legenda do presidente Lula perdeu, em um ano, cerca de um terço de seus simpatizantes no país. Em dezembro de 2004, 24% dos eleitores apoiavam o PT; agora, o percentual é de apenas 16%.
A queda pode ser, em parte, atribuída ao desgaste "natural" do governo federal, mas foi acentuada pelo escândalo de corrupção. Em junho, quando o ex-deputado Roberto Jefferson, em entrevista à Folha, denunciou o "mensalão", 21% preferiam o PT. Desde então, verificaram-se quedas sucessivas -para 19% em julho, 18% em agosto e 17% em outubro.
Embora no Brasil não se observe uma correlação firme entre preferência e voto no partido, no caso petista essa correspondência é a mais sólida entre as diversas agremiações.
De acordo com a pesquisa, a queda nas preferências pelo PT não se traduziu em aumento do apoio a outras siglas. O eleitor frustrado, ao que tudo indica, aguarda para decidir quando o quadro eleitoral estiver mais definido. E dificilmente o fará guiando-se por simpatias partidários. O risco é que a insatisfação se traduza em protestos, com o aumento dos votos nulos e brancos ou com a escolha de nomes sem qualificações para a vida pública.