domingo, novembro 27, 2005

A voz forte da CPI



Em entrevista a ÉPOCA Online, a deputada federal Denise Frossard fala sobre a crise política que atingiu o país

GRAZIELA SALOMÃO


Foto: Divulgação

O jeito direto de inquirir os depoentes da CPI dos Correios colocou em foco a deputada federal Denise Frossard. A clareza de suas perguntas confrontou, em diversos momentos da comissão, com a rebuscada retórica aplicada por outros companheiros parlamentares.

Nascida na cidade mineira de Carangola (e carioca por adoção), a juíza Denise Frossard tornou-se conhecida quando, em 1993, condenou à prisão a cúpula do jogo do bicho do Rio de Janeiro. A sentença admitiu, pela primeira vez, a existência do crime organizado no país.

Em 1998, com o objetivo de participar ativamente da vida política brasileira, Denise deixou a magistratura. Segundo ela, para ajudar a elaborar as leis, uma vez que, como costuma dizer 'juiz não faz justiça, apenas cumpre a lei'.

Indignada com o posicionamento dos parlamentares em relação ao ministro da Fazenda Antonio Palocci, que na última terça-feira ficou durante dez horas em depoimento à Comissão de Finanças e Tributação da Câmara, Denise fez duras críticas ao comportamento de seus companheiros. 'Vê que mau exemplo estamos dando. Chamamos o ministro da Fazenda para não perguntar nada para ele porque não tínhamos foco. Parecia uma audiência pública'.

Na entrevista concedida a ÉPOCA Online, a deputada ainda falou sobre a crise política do país, o comportamento do presidente Lula e o preconceito que ainda permanece em relação às mulheres políticas no Congresso Nacional.

ÉPOCA Online - Como a senhora vê os escândalos de corrupção que surgiram no governo e que resultados positivos as investigações podem trazer para o país?
Denise Frossard -
Os escândalos vieram à tona por uma mera briga pela partilha do butim. Nenhum dos instrumentos de controle funcionou e isso é um ponto preocupante. Já sabemos que teremos que melhorar esses instrumentos. O segundo ponto que veio à tona mostra que os cargos públicos que produzem decisões administrativas são alcançados para gerar dinheiro da área pública para campanhas eleitorais, partidos políticos e escorre ainda para os bolsos... O relatório lido por José Eduardo Cardoso sobre a corrupção na Skymaster mostra como havia dispensa de licitação, pregões fraudulentos, superfaturamento de preços e remessas de dinheiro para o exterior. Tudo isso foi produzido por uma decisão administrativa na máquina pública. No relatório preliminar do Cardoso ficou faltando ver quais foram as indicações políticas e chamar essas pessoas para entender por que as indicações produziram efeitos tão devastadores. Esse é um modelo, que é muito provável que aconteça em mais estatais, como Petrobrás e Banco do Brasil. Temos que investigar.

ÉPOCA Online - A imagem do Congresso hoje está manchada para o eleitor brasileiro. A senhora acha que o Congresso tem como reverter essa imagem?
Denise -
A imagem do Congresso está absolutamente deteriorada nessa legislatura. A tal ponto que a única solução será cortar na própria carne, sem dó nem piedade. E o que estou dizendo é que não devemos mostrar apenas os 18 envolvidos, mas sim os mais de cem envolvidos nas compras de votos. Não temos que indiciar as pessoas de fora do Congresso porque isso é trabalho da polícia, da Justiça e do Ministério Público. Temos que ver quem aqui de dentro está envolvido com isso. Se não formos a fundo em relação aos nossos congressistas envolvidos, evidentemente que vamos levar à ruína o Congresso Nacional.

ÉPOCA Online- Surgiram boatos de que Antonio Palocci sairia do ministério e isso reverteu no cenário econômico brasileiro. A senhora acha que uma possível saída do ministro do governo poderia ocasionar uma reviravolta na economia do país, estabilizada mesmo com a política dos juros altos?
Denise -
Eu vou falar o ideal e a realidade. Evidentemente, não deveria porque um governo eficaz tem esta impessoalidade, de modo que qualquer operação não provoque nenhum cataclisma. Mas esse governo não é assim. De fato, pode provocar uma alteração. O que eu acho em relação ao ministro é que não se deve intimá-lo. O depoimento de dez horas na terça-feira foi dramático e improdutivo. Seria necessário primeiro investigar o gravíssimo caso de corrupção de Ribeirão Preto e, se o ministro tiver algum envolvimento, aí, sim, chamá-lo. A oposição não deve agir dessa forma. Certa vez, ouvi um senador da oposição falar 'derrotamos o governo' sobre a derrubada da medida 258 e não gostei dessa frase. Muitas vezes derrotar o governo é derrotar o povo brasileiro. Uma oposição responsável não dá ''troquinho'' no governo nem faz sangrar o ministro da Economia.

ÉPOCA Online - Uma das críticas que se faz à oposição hoje é que ela não tem um papel tão forte quanto no momento em que a oposição era exercida pelo PT. Como a senhora avalia isso?
Denise -
O PT era igualmente inconseqüente na oposição. Eu vejo que hoje a oposição está copiando de seus antigos algozes seus piores exemplos. Não deveria, mas está copiando. Dos ex-adversários, a gente tem que copiar as virtudes e não os defeitos.

ÉPOCA Online - Para uma democracia amadurecida no Brasil, precisamos ter um conceito de ética muito forte. A senhora acredita que a ética no país possa ser retomada?
Denise - Acredito que sim. Mas a ética é uma virtude que só é ativada em contato com o outro. Eu sempre critico o Lula quando ele diz 'não há ninguém mais ético do que eu'. Quem pode dizer isso é o destinatário. A ética é o dia-a-dia. O povo brasileiro é ético e está julgando todos nós, parlamentares. Está julgando e vai dar o troco. Mas isso não vai aparecer em pesquisas não...

ÉPOCA Online - A senhora acredita que o resultado vai ser sentido nas eleições do ano que vem?
Denise -
Sim, o resultado será nas urnas. O povo brasileiro não gosta desse tipo de comportamento, não. Ele desliga a televisão quando começa esse palavrório inútil.

ÉPOCA Online - E qual é o seu projeto para as eleições de 2006?
Denise -
O meu partido vai lançar a minha candidatura ao governo do Rio de Janeiro.

''Com todo o respeito à figura institucional do presidente, o que Lula diz hoje não tem a menor importância''

ÉPOCA Online - São poucas as mulheres que têm uma expressividade dentro do cenário político brasileiro. A senhora acredita que ainda haja uma discriminação em relação às mulheres na política?
Denise - Eu não tenho dúvida quanto a isso. Basta olhar a mesa da Câmara e perceber que não tem nenhuma mulher integrando a mesa. E nós temos mulheres aqui da melhor qualidade que não são sequer líderes de seus partidos. Somos menos de 9% no Parlamento. Países do Norte Europeu, como a Dinamarca, conhecidos como os menos corruptos do mundo, tem quase um equilíbrio de gêneros dentro do Parlamento. Quando se tem uma igualdade de número dentro da política, tem se menos corrupção, menos mortalidade infantil e mais desenvolvimento econômico.

ÉPOCA Online - Como a senhora avalia a posição do presidente perante a crise política?
Denise - Com todo o respeito à figura institucional do presidente, hoje, o que Lula diz não tem a menor importância. Isso ficou muito claro a partir da entrevista coletiva que ele deu ao Roda Viva. O nosso presidente perdeu a credibilidade.

ÉPOCA Online - Qual a sua opinião sobre o processo de cassação do deputado José Dirceu, uma vez que esse processo vem sendo prorrogado há vários dias?
Denise -
O caso José Dirceu é um exemplo do porquê a Justiça no Brasil é lenta. Toda essa discussão é simplesmente para levá-lo a julgamento à Plenário. Quem tem bons advogados chega ao Supremo Tribunal Federal bem rápido. Eu costumo dizer que o Supremo só conhece os colarinhos brancos porque esses têm como pagar bons advogados.

ÉPOCA Online - E uma possível reeleição de Lula no ano que vem?
Denise -
O presidente Lula sabe que com os índices apresentados na pesquisa CNT/Sensus desta terça ele não tem como se reeleger.