domingo, agosto 28, 2005

Editorial do JB Trilhas incertas-fundos de pensão

JB


Maculados pelos sucessivos indícios de que se conectam a um inédito esquema de controle dos negócios do Estado, conduzido por comandantes petistas, os fundos de pensão precisam sair das investigações em curso melhor dotados de mecanismos de transparência na gestão. O primeiro passo para responder às inquietantes indagações sobre a profundidade do envolvimento desses fundos foi dado esta semana: a aprovação, nas CPIs dos Correios e do Mensalão, da quebra de sigilos bancários de 11 fundações, a maior parte ligada a estatais, referentes aos investimentos feitos nos últimos cinco anos em dois bancos - o BMG e o Rural, instituições de onde Marcos Valério de Souza diz ter retirado os R$ 55 milhões para repassar a parlamentares do PT e seus aliados. Venceu-se, assim, uma mal explicada resistência de governistas para o avanço nas investigações sobre tais movimentações bancárias.

Há, de fato, inúmeros episódios nebulosos, muitos dos quais não serão desvendados no âmbito do trabalho das comissões parlamentares de inquérito. É preciso, no entanto, que o poder público passe a investigar, para valer, o crescimento expressivo das aplicações dos fundos de pensão em bancos - suspeitos e insuspeitos. As interligações entre os fundos e um atuante grupo de militantes profissionais e de assessores ganharam vigor desde que o Partido dos Trabalhadores começou a conquistar suas primeiras prefeituras, consolidou seu domínio no campo sindical e passou a controlar essas instituições. Por elas passaram - e passam - somas astronômicas e, não à toa, vários ''titãs'' do mercado financeiro e do mundo empresarial sedimentaram suas fortunas por meio de conexões (legítimas ou não) com os fundos de pensão. O volume de investimentos em empresas (privadas e estatais) e a pouca transparência na gestão contribuem para reafirmar as inquietações.

Os fundos representam uma das mais relevantes conquistas da história recente do mercado de trabalho público e privado - a galinha dos ovos de ouro dos trabalhadores, cristalizada com especial clareza em outros países e absorvida no Brasil. Em nações como EUA, Alemanha e Japão, a rede complementar privada ajudou a arrefecer a possibilidade de falência dos sistemas de pensões e aposentadorias públicas. Por meio da conjugação dos esforços de empresas e empregados para o custeio dos planos de benefícios - complementares aos do sistema oficial - garantem-se perspectivas mais animadoras para o futuro.

No Brasil, não são raros os especialistas que vêem nos fundos de pensão um instrumento de capitalização e reorganização da poupança interna para os próximos anos, sobretudo pela necessidade de a economia brasileira aumentar urgentemente a taxa de poupança doméstica para enfrentar turbulências internacionais. Pelas magnitudes das somas administradas por essas entidades e pelo perfil de longo prazo de seus compromissos, os fundos têm grande vocação de participar do desenvolvimento da economia. Prestam-se ao financiamento de investimentos de longa duração, tão necessários à ampliação da base produtiva do país. Em português ainda mais claro: dinheiro barato e de longo prazo a serviço de investimentos relevantes.

Muitos de seus dirigentes, no entanto, vêm-se revelando célebres por seu tino para investir mal e para angariar financiamentos eleitorais bem. Sobre os gestores, sobram dúvidas quanto ao processo decisório que envolve a aplicação do dinheiro. Fala-se aqui de recursos públicos, posto que envolvem inúmeros fundos de empresas estatais. Identificar o destino de somas vultosas, seus beneficiários e as perigosas relações entre políticos, sindicatos e empresários constitui um salto gigantesco para desvendar a trilha de assaltantes de dinheiro público.